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Análise e interpretação do poema Intróito de Ary dos Santos, realizado no âmbito da disciplina de Português (10º ano de escolaridade).
O amor e a pessoa amada.
O sujeito poético traça o retrato da pessoa amada e considera a sua monotonia e serenidade como causa da fúria e da raiva que o enlouquecem.
Soneto (duas quadras e dois tercetos) com versos eneassilábicos (v. 14), decassilábicos (vv. 1-5 e 7-13) e dodecassilábicos (v. 6). A rima apresenta o seguinte esquema: abab/abab/ccd/eed. A rima é emparelhada, cruzada e interpolada.
O poema está dividido claramente em duas partes: o retrato físico e psicológico da pessoa amada (quadras e primeiro terceto) e os sentimentos que esta provoca no sujeito poético (segundo terceto). Estas duas partes encontram-se ligadas pelo verbo copulativo “ser” (“É que me vem a fúria de bater-te,”), o qual realça que as características da pessoa amada são a causa do sentimentos do sujeito poético.
Na primeira parte é de destacar o paralelismo de construção: contracção da preposição “de” com artigos definidos (enquanto o sujeito define a pessoa amada). Predominam os deícticos de segunda pessoa do singular: uso de determinantes possessivos (“tuas”, “teu”, “teus”) e formas verbais (“trazes”, “dizes”, “entendes”, “fazes”), uma vez que o sujeito poético tem como interlocutor a pessoa amada.
O sujeito poético, na primeira quadra, inicia a apresentação de um conjunto de características da pessoa amada, referindo as suas mãos frágeis, delicadas, translúcidas e doentes (“mãos de vidro” e “doentes”), mostrando-nos que ela possui riqueza (“carregadas / De jóias tilintantes”) e que é reservada (“Das palavras que trazes afogadas,”), que entende as coisas mas não as diz.
Na segunda quadra, o sujeito poético menciona o olhar dela, um olhar claro, jovem, brilhante (“Do teu olhar virado às madrugadas”) e demonstra-nos que é cativante, misterioso e rico (“De fantásticos e exóticos orientes,”). Fala, ainda, da maneira leve e elegante dela andar (“Do teu andar de tule”) e discreta de agir (“Dos gestos que não fazes mas que sentes.”).
No primeiro terceto (terceira estrofe), continua o retrato da pessoa amada descrevendo-se os dedos dela “tão brancos” que se tornam “sinistros” (que encaixam na descrição das mãos, débeis e doentes), os cabelos “lisos, de tão brandos” (o sujeito poético atribui uma característica psicológica a um aspecto da caracterização física da rapariga, reforçando a ideia de que tudo nela é demasiado sereno, brando, tranquilo) e os lábios “azuis, de tanta cor” (azul é associado à frieza, depressão e monotonia; por outro lado, é uma cor relacionada com a nobreza, esta informação conjugada com a riqueza das “jóias tilintantes” estabelece uma comparação entre a pessoa amada e uma princesa, utilizando isso para justificar a maneira de ser da pessoa amada). A utilização de advérbios de intensificação (“tão brancos”, “tão brandos”, “tanta cor”) ajuda a criar a ideia de excesso.
Na segunda parte (último terceto), há um ponto de viragem no poema, pois o sujeito apresenta o seu estado emocional actual (utilização do presente do indicativo) e mostra que ele se deve ao facto da pessoa que ama ser demasiado calma, serena, estática, discreta e monótona (o que o enlouquece e lhe provoca “fúria” e “raiva”). Esta é a primeira estrofe em que o sujeito poético fala na primeira pessoa do singular (pronome - “É que me vem a fúria de bater-te,”; determinante possessivo – “Meu amor!”).
Algumas figuras de estilo:
Metáfora: “Das tuas mãos de vidro, carregadas”; “Do teu olhar virado às madrugadas”; “Do teu andar de tule”.
Hipálage: “Das tuas mãos de vidro, carregadas / De jóias tilintantes e doentes,”
Repetição: “Meu amor! Meu amor! Meu amor!”
Construção anafórica: “É que me vem a fúria de bater-te, / É que me vem a raiva de morder-te,”
A emoção do sujeito poético é demonstrada pelas frases simples e curtas, pela utilização da frase enfática “É que me vem (…)” e pela pontuação. Predominam os verbos de acção (“trazes”, “dizes”, “fazes”, “bater”, “morder”) que se opõem à figura estática que o retrato da pessoa amada sugere.
O poema “Intróito”, de José Carlos Ary dos Santos é um pouco difícil de analisar e interpretar devido à presença de várias figuras de estilo que tornam o seu conteúdo denotativo e polissémico.
O poema acaba por ser um desabafo do sujeito poético, diria até uma queixa. Ele dirige-se à pessoa amada, apresentando-lhe as suas características, mostrando-lhe como ela é excessivamente discreta, monótona e débil. E isso provoca no sujeito poético uma tempestade de sentimentos (apercebemo-nos que o sujeito poético é emotivo e expressa os seus sentimentos facilmente, ao contrário da pessoa amada que é muito reservada).
Embora a pessoa amada enlouqueça o sujeito poético e seja a causa da sua fúria e raiva, ele demonstra que está incondicionalmente apaixonado por ela através de “Do teu olhar virado às madrugadas / De fantásticos e exóticos orientes,” e, claramente, da intensidade do último verso “Meu amor! Meu amor! Meu amor!”. O amor descontrolou de tal maneira o sujeito poético que ele já não sabe o que o alucina.
ARY DOS SANTOS (1937 – 1984)
Poeta português, natural de Lisboa. Saiu de casa aos 16 anos, exercendo várias actividades como meio de subsistência.
Revelando-se como poeta com a obra Asas (1953), publicou, em 1963, o livro Liturgia de Sangue, a que se seguiram Azul Existe, Tempo de Lenda das Amendoeiras e Adereços, Endereços (todos de 1965).
Em 1969, colaborou na campanha da Comissão Democrática Eleitoral e, mais tarde, filiou-se no Partido Comunista Português, tendo tido uma intervenção politizada, mas muito pessoal.
Ficou sobretudo conhecido como autor de poemas para canções do Concurso da Canção da RTP. Os seus temas Desfolhada e Tourada saíram ambos vencedores. Em 1971, foi atribuído a Meu Amor, Meu Amor, também da sua autoria, o grande prémio da Canção Discográfica. Declamador, gravou os discos Ary Por Si Próprio (1970), Poesia Política (1974), Bandeira Comunista (1977) e Ary por Ary (1979), entre outros. Publicou ainda os volumes Insofrimento In Sofrimento (1969), Fotos-Grafias (1971), Resumo (1973), As Portas que Abril Abriu (1975), O Sangue das Palavras (1979) e 20 Anos de Poesia (1983). Em 1994, foi editada Obra Poética, uma colectânea das suas obras.
Personalidade entusiasta e irreverente, muitos dos seus textos têm um forte tom satírico e até panfletário, anticonvencional, contribuindo decisivamente para a abertura de novas possibilidades para a música popular portuguesa. Deixou cerca de 600 textos destinados a canções.
“Ary dos Santos”, As Tormentas, http://www.astormentas.com/din/biografia.asp?autor=Ary+dos+Santos (17-05-2010)
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