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Memorial do Convento - NotaPositiva

O teu país

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Cláudia Fernandes

Escola

[Escola não identificada]

Memorial do Convento

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Resumo do trabalho

Resumo/Apontamentos sobre o livro Memorial do Convento de José Saramago, realizado no âmbito da disciplina de Português (12º ano).


Personagens

No Memorial do Convento existem personagens históricas (como D. João V, D. Ana Maria Joseha, Padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão e Domenico Scarlatti) e pe rsonagens fictícias (Baltasar Mateus e Blimunda de Jesus).

D. João V

D João V é rei de Portugal de 1706 a 1750. De carácter vaidoso, magnificente e megalómano pretende deixar uma obra que ateste a grandeza da sua riqueza e do seu poder – Convento de Mafra -, ainda que para tal se tenha que sacrificar o povo (sacrificou todos os homens válidos e a riqueza do país). Este é construído sob o pretexto de que cumpre uma promessa feita (se no espaço de um ano a sua mulher lhe desse um filho varão este construiria o convento). É um “marido leviano”, cuja relação com a rainha se rege, essencialmente, pelo cumprimento de “deveres reais e conjugais”. Dado aos prazeres da carne e a destemperos vários (teve muitos bastardos e a sua amante favorita era a Madre Pauta do Convento de Odivelas).

A caracterização do rei é feita predominantemente através da descrição das suas acções e dos seus pensamentos – de modo indirecto.

Durante algum tempo apoiou o projecto do Padre Bartolomeu Gusmão (a “passarola”).

D. Ana Maria Josefa

De origem austríaca, a rainha, surge como uma pobre mulher cuja única missão é dar herdeiros ao rei para glória do reino e alegria de todos, vive um casamento baseado na aparência, na sexualidade reprimida e no falso código ético, moral e religioso. A rainha representa a mulher que só pelo sonho se liberta da sua condição aristocrática para assumir a sua feminilidade, sentindo uma atracção incestuosa pelo cunhado D. Francisco. É símbolo do papel da mulher da época: submissa, simples procriadora, objecto da vontade masculina.

Padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão

O padre Bartolomeu, tem por alcunha “O Voador”, vive com a obsessão de “elevar-se um dia no ar, onde até agora só subiram Cristo, a Virgem e alguns santos eleitos", daí o seu projecto da “passarola”, apoiado por el-rei D. João V, que mostra-se muito empenhado no progresso do seu invento.

Mantém laços de profunda amizade com Baltasar e Blimunda, que formam o trio que vai pôr em prática o sonho de voar, e com quem, segundo as suas palavras, formam “uma trindade terrestre, o pai, o filho e o espírito Santo (XVI)”. Assim, o trabalho físico e artesanal, de Baltasar, liga-se à capacidade mágica de Blimunda e aos conhecimentos científicos do padre. Acaba por ter de se refugiar em Toledo (Espanha) devido à perseguição da Inquisição, que o acusa de bruxaria, por isso deixa o seu sonho/projecto nas mãos de Baltasar.

A sua obsessão de voar domina-o de tal forma, que ele não se inibe de integrar no seu projecto um casal não abençoado pela Igreja e de aceitar e usufruir das capacidades heréticas de Blimunda (“bruxaria”), que farão a passarola voar. A passarola, símbolo da concretização do sonho de um visionário, funciona de uma forma antagónica ao longo da narrativa: é ela que une Baltasar, Blimunda e o padre Bartolomeu, mas também é ela que vai acabar por separá-los.

A sua caracterização é feita predominantemente de forma indirecta.

Domenico Scarlatti

É um músico italiano, que veio para Portugal como professor do irmão de D. João V, o infante D. António, passando depois a ser professor da infanta D. Maria Bárbara. É um homem de completa figura, rosto comprido, boca larga e firme, olhos afastados (XVI). Scarlatti é cúmplice silencioso do projecto da passarola ("Saiu o músico a visitar o convento e viu Blimunda, disfarçou um, o outro disfarçou, que em Mafra não haveria morador que não estranhasse, e (...) fizesse logo seus juízos muito duvidosos").

Na história, a sua música tem poderes curativos que libertaram Blimunda da sua estranha doença, permitindo-lhe cumprir a sua tarefa de recolher as “vontades” ("Durante uma semana (...) o músico foi tocar duas, três horas, até que Blimunda teve forças para levantar-se, sentava-se ao pé do Cravo, pálida ainda, rodeada de música como se mergulhasse num profundo mar, (...) Depois, a saúde voltou depressa" ).

É, ainda, Scarlatti que dá a notícia a Baltasar e Blimunda da morte do padre Bartolomeu. A música do cravo de Scarlatti simboliza o ultrapassar, por parte do homem, de uma materialidade excessiva, e o atingir da plenitude da vida.

Blimunda de Jesus

Blimunda de Jesus (19 anos) é "baptizada" de Sete-Luas pelo padre Bartolomeu de Gusmão ("Tu és Sete-Sóis porque vês às claras, (...) Blimunda, que até aí só se chamava, como sua mãe, de Jesus, ficou sendo Sete-Luas, e bem baptizada estava, que o baptismo foi de padre, não alcunha de qualquer um" ).

Conhece Baltasar quando assiste ao auto-de-fé de sua mãe, acusada de feitiçaria.  Rapidamente os dois se apaixonam, e este amor puro e verdadeiro foge às normas da época.

Blimunda tem um dom: vê o interior das pessoas, herdou da mãe um "outro saber" e integra-se no projecto da passarola, porque, para o engenho voar, era preciso "prender" vontades, coisa que só Blimunda, com o seu poder mágico, era capaz de fazer. Blimunda é, simultaneamente, uma personagem que releva o domínio do maravilhoso, pelo dom que tem de ver "o interior" das pessoas (poder que nunca exerce sobre Baltasar - "Nunca te olharei por dentro"-, porque segundo ela, amar alguém é aceitá-lo sem reservas).

É Blimunda e Baltasar que guardam a passarola enquanto o padre Bartolomeu foge para Espanha. Após uma aventura voadora, a “passarola” ficou danificada e estes remendaram-na, compuseram-na e limparam-na.

Após o desaparecimento de Baltasar, Blimunda procurou-o durante 9 anos, infeliz de saudade, até que na sua sétima passagem por Lisboa, encontrou-o entre os crucificados da Inquisição, a arder numa das fogueiras, e, graças aos seus poderes, impediu que a sua vontade (alma) subisse às estrelas, guardando-a como se fosse sua.

Simbolicamente, o nome da personagem acaba por funcionar como uma espécie de reverso do de Baltasar. Para além da presença do sete, Sol e Lua completam-se: são a luz e a sombra que compõem o dia - Baltasar e Blimunda são, pelo amor que os une, um só. A relação entre os dois é também perturbadora, porque não existe casamento oficial.

Como outras personagens femininas de Saramago, também Blimunda tem uma grande firmeza interior, uma forma de oferecer-se em silêncio e de aceitar a vida e os seus desígnios sem orgulho nem submissão, com a naturalidade de quem sabe onde está e para quê.

Baltasar Mateus

Baltasar Mateus, de alcunha Sete-Sóis, deixa o exército depois de ter ficado maneta em combate contra os espanhóis. Antes de partir para a guerra era um camponês analfabeto. Conhece Blimunda em Lisboa, com 26 anos, e com ela partilha a vida e os sonhos. De ex-soldado passa a açougueiro num matadouro em Lisboa e, posteriormente, integra a legião de operários das obras do convento. A sua tarefa máxima vai ser a construção da passarola, idealizada pelo padre Bartolomeu de Gusmão, passando a ser o garante da continuidade do projecto, quando o padre Bartolomeu desaparece em Espanha.

Baltasar acaba por se constituir como a personagem principal do romance, sendo quase "divinizado" pela construção da passarola: "maneta é Deus, e fez o universo. (...) Se Deus é maneta e fez o universo, este homem sem mão pode atar a vela e o arame que hão-de voar. " - diz o padre Bartolomeu a propósito do seu companheiro de sonhos. Após a morte do padre, Baltasar ocupa-se da passarola e, um dia, num descuido, desaparece com ela nos céus. Só é reencontrado, nove anos depois, em Lisboa, a ser queimado no último auto-de-fé realizado em Portugal.

O simbolismo desta personagem é evidente, a começar pelo seu nome: sete é um número mágico, aponta para uma totalidade (sete dias da criação do mundo, sete dias da semana, sete cores do arco-íris, sete pecados mortais, sete virtudes); o Sol é o símbolo da vida, da força, do poder do conhecimento, daí que a morte de Baltasar no fogo da Inquisição signifique, também, o regresso às trevas, a negação do progresso. Baltasar transcende, então, a imagem do povo oprimido e espezinhado, sendo o seu percurso marcado por uma aura de magia, presente na relação amorosa com Blimunda, na afinidade de "saberes" com o padre Bartolomeu e no trabalho de construção da passarola.

Baltasar é um homem simples, elementar, fiel, terno e maneta, que confina a capacidade de surpresa com a resignação típica das pessoas humildes de coração e de condição. Aceita a vida que lhe foi dado viver e a mulher que o destino lhe ofereceu, sem assombro nem protestos; acata as suas circunstâncias e não tem medo nem do trabalho nem da morte. Não é um herói nem um anti-herói, é simplesmente um homem.

Narrador

O narrador garante uma contínua cumplicidade com a personagem e permite a implicação deste na narrativa:

«…que importância hão-de ter os sonhos que por trás das suas pálpebras se estão sonhando, a nós o que nos interessa é o trémulo pensamento que ainda se agita em D. Maria Ana…»

O narrador reflecte sobre o processo de escrita, desmistificando assim o seu papel:

«São comparações inventadas por quem escreve para quem andou na guerra, não as inventou Baltasar…»

O controlo da narrativa por parte do narrador é ainda verificável nos comentários valorativos ou depreciativos, nos juízos de valor e no tom moralístico que perpassa em:

. Provérbios ou profecias:

 «…a pobre não emprestes, a rico não devas, a frade não prometas…»

. Advertências ao leitor:

 «…isto se devendo ler com muita atenção para que não escape ao entendimento.»

O tom irónico ou sarcástico permite parodiar o passado histórico e o humor põe em evidência a discordância do narrador perante os factos evocados, concedendo ao leitor o espaço de julgamento inteligente, porque confia na sua perspicácia:

«…está o Rossio cheio de povo, duas vezes em festa por ser domingo e haver auto-de-fé…»

O discurso do narrador é também anti-épico, quando rebaixa heróis que a História glorifica e nos apresenta como heróis gente anónima em que se incluem personagens com defeitos físicos, como Baltasar, ou homens andrajosos, como os operários da construção do Convento de Mafra:

«…termos consentido que viesse à história quanto há de belfos e tartamudos, de coxos e prognatas, de zambros e epilépticos, de orelhudos e parvos…»

No memorial do convento, o narrador adopta muitas posições em relação à história, o que não podemos afirmar que só existe um tipo de narrador. Em seguida estão alguns exemplos textuais e o respectivo comentário relativamente ao narrador:

Exemplo1

«São pensamentos confusos que isto diriam se pudessem ser postos por ordem, aparados de excrescências, nem vale a pena perguntar, Em que estás a pensar, Sete-Sóis, porque ele responderia, julgando dizer a verdade, Em nada, e contudo já pensou tudo isto,»

Observando este excerto, verifica-se que o narrador é sem dúvida um narrador não participante – heterodiegético – e omnisciente, que conhece os pensamentos da personagem e que sabe inclusive a resposta que esta lhe daria se a interrogasse num diálogo imaginado.

Exemplo2

«Já lá vai pelo mar fora o Padre Bartolomeu Lourenço, e nós que iremos fazer agora, sem a próxima esperança do céu, pois vamos às touradas que é bem bom divertimento»

O pronome pessoal primeira pessoa e as formas verbais «iremos» e «vamos» induzem um narrador misturado com a multidão, ou seja, um narrador que também é personagem – narrador homodiegético – e que perdendo por instantes a sua faculdade omnisciente, a mais comum em toda a narração, – vai observando objectivamente o ambiente que o cerca, transformando-se num narrador observador.

Exemplo 3

«João Elvas só vê cavalos, gente e viaturas, não sabe quem está dentro ou quem vai fora, mas a nós não nos custa nada imaginar que ao lado dele se foi sentar um fidalgo caridoso e amigo de bem-fazer, que os há, e como esse fidalgo é daqueles que tudo sabem de corte e cargos, ouçamo-lo com atenção,»

Encontramos um narratário aparelhado com o narrador no imaginar e no acto de ouvir.

Exemplo 4

«El-rei foi a Mafra escolher o sítio onde há-de ser o convento. Ficará neste alto a que chamam de Vela, daqui se vê o mar, correm águas abundantes e dulcíssimas para o futuro pomar e horta que não hão-de os franciscanos de cá ser de menos que os cistercienses de Alcobaça em primores de cultivo, a S. Francisco de Assis lhe bastaria um ermo, mas esse era santo e está morto»

Aqui temos a conjugação de narrador heterodiegético e de um narrador participante, sendo que esta “mistura” é feita sem transição, sem qualquer indicador de mudança. Neste excerto, na primeira frase temos um discurso da terceira pessoa, enquanto na segunda frase a presença dos deícticos – este, daqui e cá – induzem um narrador não só presente como opinando, ou seja, cujo ponto de vista é interno.

De uma forma geral o narrador conhece tudo – o passado, o presente e até o futuro das personagens, os seus pensamentos e os seus sentimentos. Muitas vezes este conhecimento leva a que, sem transição, se passe de um discurso de terceira pessoa para um discurso de primeira pessoa que representa já o pensamento da personagem.

Exemplo 5

«Dentro do casarão esvoaçavam pardais, tinham entrado por um buraco do telhado (…) o pardal é uma ave da terra e do terriço, do estrume e da seara, e quando morto se percebe que não poderia voar alto, tão frágil de asas, tão mesquinho de ossos, veja-se o fortíssimo arcaboiço da concha que me há-de levar, com o tempo enferrujaram os ferros, mau sinal, não parece que Baltasar aqui tenha vindo como lhe recomendei tanto»

Da narração do narrador passa-se, sem solução de continuidade (sem pontuação, sem verbos que a expliquem), para o monólogo do Padre Bartolomeu de Gusmão.

Genericamente falando, estamos diante de um narrador omnisciente que, com frequência, não se coíbe de fazer juízos de valor e dar opiniões, seja de forma directa, seja de forma indirecta.

Mas para além do narrador principal há outros narradores secundários – homodiegéticos.

  • Manuel Milho que durante a ida a Pêro Pinheiro, noite após noite, vai contando parte de uma história aos companheiros.
  • João Elvas que para entreter a noite, enquanto estão abrigados no telheiro, conta a Baltasar uma série de crimes horrendos para os quais não se havia encontrado culpado.
  • Mas sobretudo um certo fidalgo – figura indefinida, quase um pretexto para tornar verosímil a descrição dos interiores faustosos e das celebrações aquando do casamento real, numa fase da narração em que o pólo narrativo era um velho mendigo, João Elvas.

Caracterização do espaço

Físico

Evocação de dois espaços principais determinantes no desenrolar da acção: Mafra e Lisboa.

Mafra: passa da vila velha e do antigo castelo nas proximidades da Igreja de Santo André para a vila nova em cujas imediações se vai construir o convento. A vila nova cria-se justamente por causa da construção do convento.

Lisboa: descrevem-se vários espaços dos quais se destacam o Terreiro do Paço, o Rossio e S. Sebastião da Pedreira:

  • Terreiro do Paço: local onde primeiramente trabalha Baltasar na sua chegada a Lisboa, descrição pormenorizada e sugestiva da procissão do Corpo de Deus, em Junho. É um espaço fulgurante de vida, com grande importância no contexto da sociedade lisboeta da época.
  • Rossio: surge no início da obra, relacionado com o auto-de-fé que aí se realiza. A reconstituição do auto-de-fé é fidedigna, a cerimónia tinha por base as sentenças proferidas pelo Tribunal do Santo Ofício e nela figuravam não só reconciliados, mas também relaxados, aqueles que eram entregues à justiça secular para a execução da pena de morte. O dia da publicação do auto era festivo, segundo se pode constatar das defesas efectuadas. A procissão propriamente dita saía na manhã de domingo da sede do Santo Ofício e percorria a cidade de Lisboa antes de chegar ao local da leitura das sentenças, numa das praças centrais. À frente seguiam os frades de S. Domingos com o pendão da Inquisição. Atrás destes os penitentes por ordem de gravidade das culpas, cada um ladeado por dois guardas. Depois, os condenados à morte, acompanhados por frades, seguidos das estátuas dos que iam ser queimados em efígie. Finalmente os altos dignitários da Inquisição, precedendo o Inquisidor-Geral. A sorte dos réus vinha estampada nos sambenitos (hábito em forma de saco, de baeta amarela e vermelha que se vestia aos penitentes dos autos-de-fé) para que a compacta multidão que se aglomerava soubesse o destino dos condenados.
  • S. Sebastião da Pedreira: local mágico ao qual só acedem o padre, Bartolomeu Lourenço, o Voador, Baltasar e Blimunda. É lá que se encontra a máquina voadora que está a ser construída em simultâneo com o Convento de Mafra. A passarola insere-se na narrativa como um mito, do qual o homem depende para viver, mito proibido mas que se evidenciará e se deixará ver pelo voo espectacular que se realizará, mostrando que ao homem nada é impossível e que a vida é uma grande aventura. S. Sebastião da Pedreira era, àquele tempo, um espaço rural, onde não faltavam fontes, terras de olival, burros, noras, e onde se situava a quinta abandonada. Ali irão as personagens, variadíssimas vezes e pelas razões mais diversas.

Social

O espaço social é construído através do relato de determinados momentos e do percurso de personagens que simbolizam um determinado grupo social.

Destaca-se:

1.Procissão da Quaresma:

a.Excessos praticados durante o Entrudo (satisfação dos prazeres carnais) e brincadeiras carnavalescas – as pessoas comiam e bebiam demasiado, davam “umbigadas pelas esquinas”, atiravam água à cara umas das outras, batiam nas mais desprevenidas, tocavam gaitas, espojavam-se nas ruas

b.Penitência física e mortificação da alma após os “abusos” durante o Entrudo (é tempo de “mortificar a alma para que o corpo finja arrepender-se”)

c.Descrição da procissão (os penitentes à cabeça, atrás dos frades, o bispo, as imagens nos andares, as ordens e as irmandades)

d.Manifestações de fé que tocavam a histeria (as pessoas arrastam-se pelo chão, arranham-se, puxam os cabelos, esbofeteiam-se) enquanto o bispo faz sinais da cruz a um acólito balançam o incensório; os penitentes recorrem à autoflagelação.

2.Autos-de-fé

a.O Rossio está novamente cheio de assistência; a população está duplamente em festa, porque é domingo e porque vai assistir a um auto-de-fé (passaram dois anos após o último evento deste tipo).

b.O narrador revela a sua dificuldade em perceber se o povo gosta mais de autos-de-fé ou de touradas, evidenciando com esta afirmação a sua ironia crítica perante um povo que revela um gosto sanguinário e procura nas emoções fortes uma forma de preencher o vazio da sua existência.

c.A assistência feminina, à janela, exibe as suas “toilettes”, preocupa-se com pormenores fúteis relativos à sua aparência (a segurança dos sinaizinhos no rosto, a borbulha encoberta), e aproveita a ocasião para se entregar a jogos de sedução com os pretendentes que se passeiam em baixo.

d.A proximidade da morte dos condenados constitui o motivo do ambiente de festa; esta constatação suscita, mais uma vez, a crítica do narrador - na realidade, o facto de as pessoas saberem que alguns dos sentenciados iriam, em breve, arder nas fogueiras não as inibia de se refrescarem com água, limonada e talhadas de melancia e de se consolarem com tremoços, pinhões, tâmaras e queijadas;

e.Sai a procissão - à frente os dominicanos; depois, os inquisidores

f.Distinção entre os vários sentenciados, assim como o crucifixo de costas voltadas, para as mulheres que irão arder na fogueira;

g.Menção dos nomes de alguns dos condenados (inclusivamente, o de Sebastiana Maria de Jesus, mãe de Blimunda)

h.Início da relação entre Baltasar e Blimunda

i.Punição dos condenados pelo Santo Ofício - o povo dança em frente das fogueiras

3.Tourada (Terreiro do Paço)

a.O espectáculo começa e o narrador enfatiza a forma como os touros são torturados, exibindo o sangue, as feridas, as "tripas“ ao público que, em exaltação, se liberta de inibições ("os homens em delírio apalpam as mulheres delirantes, e elas esfregam-se por eles sem disfarce”;

b.Dois toiros saem do curro e investem contra bonecos de barro colocados na praça; de um saem coelhos que acabam por ser mortos pelos capinhas, de outro, pombas que acabam por ser apanhadas pela multidão;

c.A ironia do narrador é ainda traduzida pela constatação de que, em Lisboa, as pessoas não estranham o cheiro a carne queimada, acrescentando ainda numa perspectiva crítica, que a morte dos judeus é positiva, pois os seus bens são deixados à Coroa;

4.Procissão do Corpo de Deus

1.Preparação da procissão:

a.Descrição dos "preparos da festa” feita pelo narrador, que assume o olhar do povo (as colunas, as figuras, os medalhões, as ruas toldadas, os mastros enfeitados com seda e ouro, as janelas ornamentadas com cortinas e sanefas de damasco e franjas de ouro), que se sente maravilhado com a riqueza da decoração (uma reflexão do narrador leva-o a concluir que não se verificam muitos roubos durante a cerimónia, pois o povo teme os pretos que se encontram armados à porta das lojas e os quadrilheiros, que procederiam à prisão dos infractores)

b.Referência do narrador às damas que aparecem às janelas, exibindo penteados, rivalizando com as vizinhas e gritando motes

c.À noite, passam pessoas que tocam e dançam, improvisa-se uma tourada

d.De madrugada, reúnem-se aqueles que irão formar as alas da procissão, devidamente fardados.

2. Realização da procissão;

O evento começa logo de manhã cedo. DESCRIÇÃO DO APARATO:

a.À frente, as bandeiras dos ofícios da Casa dos Vinte e Quatro, em primeiro lugar a dos carpinteiros em honra a S. José; atrás, a imagem de S. Jorge, os tambores, os trombeteiros, as irmandades, o estandarte do Santíssimo Sacramento, as comunidades (de S. Francisco, capuchinhos, carmelitas, dominicanos, entre outros) e o rei, atrás, segurando uma vara dourada, Cristo crucificado e cantores de hinos sacros.

Outros espaços sociais são:

  • O trabalho no Convento – Mafra simboliza o espaço da servidão desumana a que D. João V sujeitou o seu povo (cerca de 40 mil trabalhadores).
  • A miséria do Alentejo – este espaço associa-se à fome e à miséria

Acção e os seus planos

A análise de Memorial do Convento permite constatar a existência de duas narrativas simultâneas: uma de carácter histórico – a construção do convento de Mafra – e outra ficcionada – a construção da passarola que engloba a história de amor entre Baltasar e Blimunda.

A acção principal diz respeito à concretização do plano de D.João V – a edificação do convento. Mas nesta encaixam-se outras acções, constituindo diferentes linhas de acção que se articulam com a primeira.

Linhas de acção presentes na obra:

1ª linha de acção: A do rei D.João V

Abrange todas as personagens da família real e relaciona-se com a segunda linha de acção, uma vez que a promessa do rei é que vai possibilitar a construção do convento. Esta linha tem como espaço principal a corte e, depois, o convento, na altura da sua inauguração, no dia de aniversário do rei.

2ª linha de acção: A dos construtores do convento

Esta é a linha principal da história, a par da quarta – a que respeita à construção da passarola. Esta segunda linha de acção vai ganhando relevo e une a primeira à terceira: se o convento é obra e promessa do rei, é ao sacrifício dos homens, aqui representados por Baltasar e Blimunda, que ela se deve. Glorificam-se aqui os homens que se sacrificam, passam por dificuldades, mas que também as vencem.

3ª linha de acção: A de Baltasar e Blimunda

Nesta linha relata-se uma história de amor e o modo de vida do povo português. As duas personagens (Baltasar e Blimunda) são as construtoras da passarola; a figura masculina é também, depois, construtora do convento, constituindo-se paradigma da força que faz mover Portugal – a do povo.

4ª linha de acção: A de Bartolomeu Lourenço

Esta relaciona-se com o sonho e o desejo de construir uma máquina voadora. Articula-se com a primeira e segunda linhas de acção, porque o padre é o mediador entre a corte e o povo. Também se enquadra na terceira linha, dado que a construção da passarola resulta da força das vontades que Blimunda tem de recolher para que a passarola voe e a força física necessária pela parte de Baltasar.

Pela análise das sequências narrativas da obra, verifica-se a existência de um plano ficcional que se cruza com a História, uma vez que a construção da passarola, evento a que a História se refere, acaba por ser ficcionada quando se afirma que se moverá pela força das «vontades» que Blimunda recolhe.

Visão crítica

Tendo como pretexto a construção do convento de Mafra, Saramago, adoptando a perspectiva de um narrador distanciado do tempo da diegese, apresenta uma visão crítica da sociedade portuguesa da primeira metade do século XVIII. É neste sentido que Memorial do Convento transpõe a classificação de romance histórico, uma vez que não se trata de uma mera reconstituição de um acontecimento histórico, mas é antes um testemunho intemporal e universal do sofrimento de um povo sujeito à tirania de uma sociedade em que só a vontade de el-rei prevalecem o resto é nada (XXII).

Logo desde o início do romance é visível o tom irónico e, até mesmo, sarcástico do narrador relativamente à hipotética esterilidade da rainha e à infidelidades do rei. Esta atitude irónica do narrador mantém-se ao longo da obra, denunciando o comportamento leviano do rei, a sua vaidade desmedida e as promessas megalómanas de que resulta o sofrimento extremo de homens que não fizeram filho nenhum à rainha e eles é que pagam o voto, que se lixam (XIX).

O clero, que exerce o seu poder sobre o povo ignorante através da instauração de um regime repressivo entre os seus seguidores e que constantemente quebra o voto de castidade, também não escapa ao olhar crítico e sarcástico do narrador. A actuação da Inquisição que, à luz da fé cristã, manipula os mais fracos é de igual modo criticada ao longo do romance, nomeadamente, através da apresentação de diversos autos-de-fé e uma crítica às pessoas que dançam em volta das fogueiras onde se queimaram os condenados.

Assim, é sobretudo as personagens de estatuto social privilegiado que são o alvo de maiores críticas por parte do narrador que denuncia as injustiças sociais, a omnipotência dos poderosos e a exploração do povo – evidenciada nas miseráveis condições de trabalho dos operários do convento de Mafra; ao mesmo tempo que denota empatia face aos mais desfavorecidos, cujo esforço elogia e enaltece.

A crítica estende-se, ainda: à Justiça portuguesa que castiga os pobres e despenaliza os ricos, ao facto de se desprezar os artífices e os produtos nacionais em defesa dos estrangeiros, bem como ao adultério e à corrupção generalizados.

Em suma, Memorial do Convento constitui acima de tudo uma reflexão crítica – ao problematizar temas perfeitamente adaptáveis à época contemporânea do autor – conducente a uma releitura do passado e à correcção da visão que se tem da História

A simbologia

Começando pelo nome das personagens principais, há que referir que em ambas (Baltasar Sete-Sóis e Blimunda Sete-Luas) é-nos transmitida uma ideia de união, de complementaridade e de perfeição, traduzidas pela simbologia do número sete. De acordo com a numerologia simbólica, podemos constatar, também, que ambos os nomes representam perfeição, totalidade e até magia, sugeridas pela extensão trissílaba (e aqui reside a simbologia do número três, revelador de uma ordem intelectual e espiritual traduzida na união do céu e da terra).

Vários mutilados surgem na construção do convento («isto é uma terra de defeituosos, um marreco, um maneta, um zarolho»), onde se inclui obviamente Baltasar. Tal situação poderá levar à interpretação simbólica da luta desmedida na construção de algo, como realização de um sonho. Baltasar, após ter perdido a mão esquerda num episódio bélico, empreende outras lutas: na construção da passarola e na colaboração na edificação do convento de Mafra. Simbolicamente, a perda de parte do seu lado esquerdo significou a amputação da sua dimensão mais nefasta, mais masculina, mais passada; ganhou, assim, uma dimensão mais espiritual, marcada pela perseverança, força, luta e sentido de futuro que sairá reforçada na associação com Blimunda.

A riqueza interior de Blimunda apresenta-se, simbolicamente, pela força do seu olhar, possuidor de um poder mágico.

Metaforicamente, surgem as duas mil “vontades” necessárias para realizar o sonho do padre Bartolomeu. Trata-se de vontades humanas que, ao longo dos tempos, originaram o progresso do mundo com a invenção de “aparelhos voadores” e de todos os objectos concebidos pelo homem. Não será por acaso que essas vontades são metaforizadas pelas nuvens. Estas ocupam um lugar ascendente em relação à terra, um espaço intermédio relativamente ao céu. Também lhes está associada uma ideia de verticalidade. Por estes aspectos, as vontades (nuvens) estão carregadas de um carácter eufórico (positivo); contudo, de difícil acesso. Só uma personagem como Blimunda conseguiria interpenetrar neste mundo não material.

Ainda no que concerne à simbologia dos números, o sete não aparece sé associado aos nomes de Baltasar e Blimunda, como também à data e à hora da sagração do convento, aos sete anos vividos em Portugal pelo músico Scarlatti, sete vezes que Blimunda passa por Lisboa à procura de Baltasar, às sete igrejas visitadas na Páscoa, aos sete bispos que baptizaram Maria Xavier Francisca comparados a sete sóis de ouro e prata nos degraus do altar-mor (“Sete bispos a baptizaram que eram como sete sóis de ouro e prata nos degraus do altar-mor”).

O número nove surge também a simbolizar insistência e determinação quando Blimunda procura o homem amado durante nove anos. Este número encerra também simbolicamente a ideia de procura. O nove «simboliza o coroamento dos esforços, o concluir de uma criação e o recomeço», tal como aconteceu a Blimunda que, após os nove longos anos de busca, reencontra finalmente Baltasar; não um encontro físico, mas místico e completo («Naquele extremo arde um homem a quem falta a mão esquerda. (…) E uma nuvem fechada está no centro do seu corpo. Então Blimunda disse, Vem. Desprendeu-se a vontade de Baltasar Sete-Sóis, mas não subiu par as estrelas, se à terra pertencia e a Blimunda»).

Relações amorosas

A Utopia do Amor

Baltasar

Blimunda

Do sonho à concretização

O paralelismo simbólico dos episódios iniciais e finais

Auto-de-fé de Sebastiana Maria de Jesus, mãe de Blimunda As últimas páginas... Auto-de-fé de Baltasar Sete-Sóis
Primeiro encontro entre Blimunda e Baltasar - Blimunda "repetia um itinerário de há vinte e oito anos". - O rio como imagem da precariedade da vida. - Blimunda está em Lisboa pela sétima vez: encerramento de um ciclo de vida. Último encontro de Blimunda e Baltasar
- "Que nome é o seu, e o homem disse, naturalmente, assim reconhecendo o direito de esta mulher lhe fazer perguntas". - "Naquele extremo arde um homem a quem falta a mão esquerda".
Espaço - Rossio Espaço - Rossio
- "O Rossio está cheio de povo". - "Meteu-se pela Rua Nova dos Ferros, virou para a direita na igreja de Nossa Senhora de Oliveira, em direcção ao Rossio"
Ambiente soturno:   Ambiente soturno:
- "sobre o Rossio caem as grandes sombras do convento do Carmo; - "e as pessoas voltarão às suas casas, refeitas na fé, levando agarrada à sola dos sapatos alguma fuligem, pegajosa poeiras de carnes negras, sangue acaso ainda viscoso se nas brasas não se evaporou". - "caminhava no meio de fantasmas, de neblinas que eram gente"; - "Entre os mil cheiros fétidos da cidade, a aragem nocturna trouxe-lhe o da carne queimada".
A multidão reúne-se A multidão reúne-se
- "O Rossio está cheio de povo". - "havia multidão em S. Domingos"
As condenações da Inquisição: As condenações da Inquisição:
- condenação da mãe de Blimunda (ao degredo). - condenação de António José da Silva, "autor de comédias de bonifrates"; - condenação de Baltasar Sete-Sóis.
Ritual de morte
Blimunda comunica enigmaticamente com a mãe Blimunda que, no primeiro encontro com Baltasar, prometera que nunca o veria por dentro, usa os seus dons nos momentos finais da vida de Baltasar e vê uma nuvem fechada que está no centro do seu corpo - RECOLHE A SUA VONTADE. Blimunda comunica enigmaticamente com Baltasar
- "não fales, Blimunda, olha só com esses olhos que tudo são capazes de ver; - "adeus Blimunda que não te verei mais".

- "Então Blimunda disse, Vem. Desprendeu-se a vontade de Baltasar Sete-Sóis".



301 Visualizações 04/01/2020