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Os Lusíadas - Luís de Camões - NotaPositiva

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Os Lusíadas – Luís de Camões

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Resumo do trabalho

Resumo/Apontamentos sobre a obra "Os Lusíadas" do poeta e escritor Luís de Camões, realizado no âmbito da disciplina de Português (12º ano).


Luís de Camões

Luís de Camões nasceu em 1524 ou 25, provavelmente em Lisboa, filho de Simão Vaz de Camões e Ana de Sá Macedo, família nobre estabelecida em Portugal na época de D. Fernando.

Os vastos conhecimentos e cultura do poeta são normalmente justificados por este ter frequentado o ensino superior. Pensa-se que estudou em Coimbra de 1531 a 1541, onde terá frequentado aulas de Humanidades já que aí tinha o seu tio, D. Bento de Camões, que era sacerdote e sábio.

No entanto, embora a existência desse tio esteja documentada, não há qualquer registo da passagem do poeta por Coimbra. Em algum lado, afirmam os estudiosos da sua vida, terá adquirido a grande bagagem cultural que nas suas obras demonstra possuir.

Antes de 1550 estava a viver em Lisboa, onde permaneceu até 1553. Essa estadia foi interrompida por uma expedição a Ceuta onde serviu como soldado, aí perdendo um olho.

Em 1552 regressou a Lisboa, levando aí uma vida de boémia. São-lhe atribuídos vários amores, não só por damas da corte mas até pela própria Infanta D. Maria, irmã do Rei D. Manuel I.

Na sequência de uma desordem ocorrida no Rossio, em dia do Corpo de Deus, na qual feriu, numa rixa, Gonçalvo Borges, foi preso por largos meses na cadeia do Tronco e só saiu – apesar de perdoado pelo ofendido – com a promessa de embarcar para a Índia (sendo este um dos poucos factos da sua vida que os documentos corroboram). Diz-se que foi nesse ano de prisão que Camões compôs o primeiro canto da sua obra “Os Lusíadas”.

Regressou a Portugal, mas pelo caminho naufragou na costa de Moçambique, salvando a nado Os Lusíadas, e foi forçado, por falta de meios para prosseguir a viagem, a ficar aí. Foi em Moçambique que seu amigo Diogo do Couto o encontrou, encontro que relata na sua obra, acrescentando que o poeta estava "tão pobre que vivia de amigos", ou seja, vivia do que os amigos podiam dar-lhe. Foi Diogo do Couto quem lhe pagou a viagem até Lisboa, onde Camões finalmente aportou em 1569.

Nessa altura, além dos últimos retoques em “Os Lusíadas”, trabalhava numa obra lírica, o Parnaso, que lhe roubaram – o que, em parte, explica que não tenha publicado a lírica em vida.

Chega a Lisboa em 1569 e publica Os Lusíadas em 1572, graças à influência de alguns amigos junto do rei D. Sebastião.

Apesar do enorme êxito do poema e de lhe ter sido atribuída uma tença anual de 15000 réis, essa foi sempre paga tarde e a má horas e não salvando o poeta da extrema pobreza.

Morreu em 10 de Junho de 1580. O seu túmulo, que teria sido na cerca do Convento de Sant'Ana, em Lisboa, perdeu-se com o terramoto de 1755, pelo que se ignora o paradeiro dos restos mortais do poeta, que não está sepultado em nenhum dos dois túmulos oficiais que hoje lhe são dedicados – um no Mosteiro dos Jerónimos e outro no Panteão Nacional.

Alguns dos seus sonetos, como o conhecido Amor é fogo que arde sem se ver, pela ousada utilização dos paradoxos, prenunciam já o Barroco que se aproximava.

Algum tempo mais tarde, D. Gonçalo Coutinho mandou gravar uma lápide para a sua campa com a citação: “Aqui jaz Luís de Camões, Príncipe dos Poetas de seu tempo. Viveu pobre e miseravelmente, e assi morreu”

A comemoração do dia da sua morte, é atualmente relembrado como o “Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas”, sendo feriado nacional.

Os Lusíadas

Estrutura externa

10 cantos – nº variável de estrofes (Oitavas)

Dez sílabas métricas (decassílabas)

Ab ab ab cc – cruzada e emparelhada

Estrutura interna

Proposição (I, 1-3)

Camões apresenta o que se propõe a cantar

Navegações e os seus feitos

Reis conquistaram terras

Difundir a fé cristã (Plano da História de Portugal)

Todos aqueles que fizeram algo digno de memória, ultrapassando a lei da Morte (não são esquecidos)

Invocação (I, 4-5)

Camões pede inspiração as Tágides (ninfas do Tejo) [posteriormente noutros cantos invoca as ninfas do Mondego, Calíope (musa da poesia épica) e novamente as Tágides]

“Cantando espalharei por toda a parte se a tanto me ajudar o engenho e a arte” (talento e inspiração)

Dedicatória (I, 6-18)

Camões dedica o seu poema ao rei D. Sebastião

Narração (I, 19 ->)

Camões narra a viagem dos portugueses e a História de Portugal

    • Plano da Viagem (ação principal)
    • Plano da História (ação secundária)
    • Plano do Poeta (Comentários, reflexões, considerações, conselhos e críticas sobre diversos assuntos)
    • Plano da Mitologia

Os Lusíadas são um produto do renascimento e, como tal, surgiram do propósito de fazer renascer o género épico característico da antiguidade clássica. Deste modo segue o mesmo esquema de construção das epopeias antigas. No entanto, a dedicatória em “Os Lusíadas”, constitui a parte original da obra. Tal como as outras, também nesta a cação é apresentada in media rés, ou seja, Camões começa a contra a história quando a cação já vai a meio.

Narração (I, 19)

Est. 19

“Já no largo oceano navegavam”

- Viagem decorria normalmente

(Plano da Viagem)

“Quando os deuses no Olimpo luminoso,

Onde o governo esta da humana gente,

Se ajustam em consílio glorioso,

Sobre as causas futuras do oriente”

(Plano da mitologia)

Os deuses que governam os homens juntam-se em consílio para decidirem sobre o futuro dos portugueses.

Relação de simultaneidade (as duas ações ocorrem ao mesmo tempo)

Consílio:

Júpiter – Adjuvante aos Portugueses

Baco – Opositor aos Portugueses                  Veredicto a favor dos Portugueses

Vénus - Adjuvante aos Portugueses              que prosseguem a viagem

Marte - Adjuvante aos Portugueses

I, 105, 106

“Onde pode acolher-se um fraco homem,

Onde terá segura a curta vida,

Que não se arme e se indigne o céu sereno

Contra um bicho da terra tão pequeno”

Mistificação do herói Episódios – Mitológicos (concílio dos Deuses)

  • Líricos (Inês de Castro e Formosíssima Maria)
  • Míticas/Simbólicos – (Adamastor e O Velho do Restelo)
  • Naturalista – (Tempestade e Trompa marítima)
  • Bíblica – batalha (Ourique, Salado, Aljubarrota)
.

Canto I (19-20)

.

Já no largo Oceano navegavam,

As inquietas ondas apartando;

Os ventos brandamente respiravam,

Das naus as velas côncavas inchando;

Da branca escuma os mares se mostravam

Cobertos, onde as proas vão cortando

As marítimas águas consagradas,

Que do gado de Próteu são cortadas,

.

Quando os Deuses no Olimpo luminoso,

Onde o governo está da humana gente,

Se ajuntam em consílio glorioso,

Sobre as cousas futuras do Oriente.

Pisando o cristalino Céu fermoso,

Vêm pela Via Láctea juntamente,

Convocados, da parte de Tonante,

Pelo neto gentil do velho Atlante.

.

Canto I (105-106)

.

O recado que trazem é de amigos,

Mas debaxo o veneno vem coberto,

Que os pensamentos eram de inimigos,

Segundo foi o engano descoberto.

Ó grandes e gravíssimos perigos,

Ó caminho de vida nunca certo,

Que aonde a gente põe sua esperança

Tenha a vida tão pouca segurança!

.

No mar tanta tormenta e tanto dano,

Tantas vezes a morte apercebida!

Na terra tanta guerra, tanto engano,

Tanta necessidade avorrecida!

Onde pode acolher-se um fraco humano,

Onde terá segura a curta vida,

Que não se arme e se indigne o Céu sereno

Contra um bicho da terra tão pequeno?

.

Reflexão sobre a fragilidade da vida humana, a propósito da chegada dos navegadores lusos a Mombaça, onde um falso piloto conduzira Vasco da Gama com o objectivo secreto de destruir a armada por ordem a Baco.

Deste caso particular, Camões generaliza, evidenciando o carácter trágico e frágil da condição humana – a insegurança e a importância do homem face aos perigos que o rodeiam. Só pelas suas características de herói poderá o homem, “infinitamente pequeno”, libertar-se da lei da morte (esquecimento) e tornar-se “infinitamente grande” apesar da sua fragilidade.

.

Episódio simbólico do Velho do Restelo (Canto IV, Est 94-104)

.

"Mas um velho d'aspeito venerando,

Que ficava nas praias, entre a gente,

Postos em nós os olhos, meneando

Três vezes a cabeça, descontente,

A voz pesada um pouco alevantando,

Que nós no mar ouvimos claramente,

C'um saber só de experiências feito,

Tais palavras tirou do experto peito:

.

- "Ó glória de mandar! Ó vã cobiça 

Desta vaidade, a quem chamamos Fama! 

Ó fraudulento gosto, que se atiça 

C'uma aura popular, que honra se chama! 

Que castigo tamanho e que justiça 

Fazes no peito vão que muito te ama! 

Que mortes, que perigos, que tormentas, 

Que crueldades neles experimentas!

.

- "Dura inquietação d'alma e da vida,

Fonte de desamparos e adultérios,

Sagaz consumidora conhecida

De fazendas, de reinos e de impérios:

Chamam-te ilustre, chamam-te subida,

Sendo dina de infames vitupérios;

Chamam-te Fama e Glória soberana,

Nomes com quem se o povo néscio engana!

.

- "A que novos desastres determinas

De levar estes reinos e esta gente?

Que perigos, que mortes lhe destinas

Debaixo dalgum nome preminente?

Que promessas de reinos, e de minas

D'ouro, que lhe farás tão facilmente?

Que famas lhe prometerás? que histórias?

Que triunfos, que palmas, que vitórias?

.

- "Mas ó tu, geração daquele insano,

Cujo pecado e desobediência,

Não somente do reino soberano

Te pôs neste desterro e triste ausência,

Mas inda doutro estado mais que humano

Da quieta e da simples inocência,

Idade d'ouro, tanto te privou,

Que na de ferro e d'armas te deitou:

.

- "Já que nesta gostosa vaidade

Tanto enlevas a leve fantasia,

Já que à bruta crueza e feridade

Puseste nome esforço e valentia,

Já que prezas em tanta quantidades

O desprezo da vida, que devia

De ser sempre estimada, pois que já

Temeu tanto perdê-la quem a dá:

.

- "Não tens junto contigo o Ismaelita,

Com quem sempre terás guerras sobejas?

Não segue ele do Arábio a lei maldita,

Se tu pela de Cristo só pelejas?

Não tem cidades mil, terra infinita,

Se terras e riqueza mais desejas?

Não é ele por armas esforçado,

Se queres por vitórias ser louvado?

.

- "Deixas criar às portas o inimigo,

Por ires buscar outro de tão longe,

Por quem se despovoe o Reino antigo,

Se enfraqueça e se vá deitando a longe?

Buscas o incerto e incógnito perigo

Por que a fama te exalte e te lisonge,

Chamando-te senhor, com larga cópia,

Da Índia, Pérsia, Arábia e de Etiópia?

.

- "Ó maldito o primeiro que no mundo

Nas ondas velas pôs em seco lenho,

Dino da eterna pena do profundo,

Se é justa a justa lei, que sigo e tenho!

Nunca juízo algum alto e profundo,

Nem cítara sonora, ou vivo engenho,

Te dê por isso fama nem memória,

Mas contigo se acabe o nome e glória.

.

- "Trouxe o filho de Jápeto do Céu

O fogo que ajuntou ao peito humano,

Fogo que o mundo em armas acendeu

Em mortes, em desonras (grande engano).

Quanto melhor nos fora, Prometeu,

E quanto para o mundo menos dano,

Que a tua estátua ilustre não tivera

Fogo de altos desejos, que a movera!

.

- "Não cometera o moço miserando

O carro alto do pai, nem o ar vazio

O grande Arquiteto co'o filho, dando

Um, nome ao mar, e o outro, fama ao rio.

Nenhum cometimento alto e nefando,

Por fogo, ferro, água, calma e frio,

Deixa intentado a humana geração.

Mísera sorte, estranha condição!"

. 1. Proceda à contextualização do episódio dentro da estrutura externa e interna da obra.

O episódio encontra-se na narração, canto IV, estrofes 94-104, plano da viagem quando Vasco da Gama e restantes navegadores se encontram de partida rumo à Índia.

2. Faça a caracterização do Velho do Restelo.

Este Velho que aparece nas praias tem um aspecto “venerando”, ou seja, respeitável. Mostra claramente que está descontente com o facto de os homens partirem rumo ao desconhecido pois meneia três vezes a cabeça em sinal de desagrado. A sua voz é “pesada”, símbolo de reflexão e ponderação. É um homem sábio “Cum saber só d’experiências feito”, atributos que a velhice lhe concedeu.

3. Elabore um breve resumo das estrofes 95 à 97.

O Velho considera que a viagem rumo à Índia se baseia apenas na cobiça desmedida do homem e na ambição gananciosa, valores que ele considera negativos. Segundo ele, as consequências serão desastrosas “mortes, perigos, tormentas crueldades” e contribuirão para a desagregação quer das famílias quer do próprio reino.

4. Na estrofe 100, o Velho apresenta uma proposta alternativa à expansão para o Oriente. Explicite-a.

Nesta estrofe, o Velho do Restelo propõe que se abandone os planos de expansão para o Oriente para dar lugar à conquista do Norte de África e pergunta para que partir para tão longe quando os mouros, os inimigos da pátria, estão tão perto.

5. Refira-se ao carácter simbólico deste episódio.

Este episódio tem um carácter simbólico na medida em que a posição do Velho representa a posição retrógrada de todos quantos, na época. Condenavam o progresso e a ambição do homem. Ele é, assim, a voz da discórdia face à empresa dos descobrimentos, voz da razão e do bom senso que expressa o receio do desconhecido, o perigo da morte e o medo da perda. Condena o aventureirismo e a loucura que leva estes homens a abraçarem destinos desconhecidos.

6. Explicite de que modo este episódio contribui para a crescente heroicidade do “bicho da terra tão pequeno”.

Este episódio contribui para os caminhos a percorrer para ser herói, visto que os navegadores fizeram ouvidos moucos à voz do Velho. Ao calar dentro de si o medo sentido pelo inserto e desconhecido e ao darem viva voz à loucura e à coragem abriram caminho para se tornarem verdadeiros heróis e alcançarem os seus sonhos, independentemente dos medos e perigos. Herói não é aquele que não tem medo, é aquele que, apesar do medo que sente, não desiste dos seus sonhos e objectivos, pelo contrário, enfrenta-os com força e determinação.

.

Canto V (16-22)

Objectivo da inclusão: Mostra a valentia, a força e a coragem dos portugueses ao ultrapassarem os fenómenos meteorológicos.

.

"Contar-te longamente as perigosas

Coisas do mar, que os homens não entendem:       Gama refere todo o tipo de fenómenos meteorológicos que os marinheiros experienciaram

Súbitas trovoadas temerosas,                                     

Relâmpados que o ar em fogo acendem,                  

Negros chuveiros, noites tenebrosas,                          

Bramidos de trovões que o mundo fendem,

Não menos é trabalho, que grande erro,

Ainda que tivesse a voz de ferro.

.

"Os casos vi que os rudos marinheiros,

Que têm por mestra a longa experiência,

Contam por certos sempre e verdadeiros,

Julgando as cousas só pela aparência,

E que os que têm juízos mais inteiros,

Que só por puro engenho e por ciência,

Vêem do mundo os segredos escondidos,

Julgam por falsos, ou mal entendidos.

.

"Vi, claramente visto, o lume vivo   →   Pleonasmo

Que a marítima gente tem por santo

Em tempo de tormenta e vento esquivo,

De tempestade escura e triste pranto.

Não menos foi a todos excessivo

Milagre, e coisa certo de alto espanto,

Ver as nuvens do mar com largo cano

Sorver as altas águas do Oceano.

.

"Eu o vi certamente (e não presumo

Que a vista me enganava) levantar-se

No ar um vaporzinho e subtil fumo,       →   Figura de estilo: Gradação

E, do vento trazido, rodear-se:

Daqui levado um cano ao pólo sumo

Se via, tão delgado, que enxergar-se

Dos olhos facilmente não podia:

Da matéria das nuvens parecia.

.

"Ia-se pouco e pouco acrescentando

E mais que um largo masto se engrossava;

Aqui se estreita, aqui se alarga, quando

Os golpes grandes de água em si chupava;

Estava-se coas ondas ondeando:

Em cima dele uma nuvem se espessava,

Fazendo-se maior, mais carregada

Co'o cargo grande d'água em si tomada.

.

"Qual roxa sanguessuga se veria

Nos beiços da alimária (que imprudente,

Bebendo a recolheu na fonte fria)

Fartar co'o sangue alheio a sede ardente;

Chupando mais e mais se engrossa e cria,

Ali se enche e se alarga grandemente:

Tal a grande coluna, enchendo, aumenta

A si, e a nuvem negra que sustenta.

.

"Mas depois que de todo se fartou,

O pó que tem no mar a si recolhe,

E pelo céu chovendo enfim voou,

Porque coa água a jacente água molhe:

As ondas torna as ondas que tomou,

Mas o sabor do sal lhe tira e tolhe.

Vejam agora os sábios na escritura,

Que segredos são estes de Natura.

.

"Se os antigos filósofos, que andaram

Tantas terras, por ver segredos delas,

As maravilhas que eu passei, passaram,

A tão diversos ventos dando as velas,

Que grandes escrituras que deixaram!

Que influição de signos e de estrelas!

Que estranhezas, que grandes qualidades!

E tudo sem mentir, puras verdades.

. 1. Refira a que “perigosas/cousas do mar” faz referencia o Gama.

O Gama refere todo o tipo de fenómenos atmosféricos/meteorológicos que os marinheiros experienciaram, nomeadamente “trovoadas”, relâmpagos, chuvadas, “noites tenebrosas” e “trovões”. São estes fenómenos que conferem experiência aos marinheiros.

2. Na estrofe 17, o narrador (Gama) aponta uma característica comum a todos os acontecimentos por que passaram e agora conta. Aponte-a.

A característica comum é a certeza e a veracidade.

3. Refira a que acontecimento alude seguidamente.

Seguidamente alude ao fenómeno atmosférico do fogo-de-santelmo.

4. Em relação a este fenómeno, qual a figura de estilo mais em evidência? Justifique.

Através deste episódio a gradação assume especial relevância na medida em que os fenómenos aqui relatados e com os quais os portugueses se defrontam, são descritos de forma gradual desde o seu lento aparecimento até à sua extinção. “Ia-se pouco e pouco acrescentando”, “Fazendo-se maior, mais carregada”.

5. Explicite os caminhos da heroicidade aqui referidos.

São estes acontecimentos que conferem aos homens o tal saber de experiencias feito tão típico de homem renascentista. Apontam, no entanto, a impotência do ser humano face a todo o tipo de fenómenos que ele não consegue controlar e que tem de defrontar, indo a pouco e pouco, reforçando a sua atitude de herói. O caminho da heroicidade aqui, neste caso, é o encontro com as forças da Natureza, sendo, por isso, um episódio de carácter Naturalista.

.

Canto V (37-51) – Episódio do Adamastor

.

"Porém já cinco Sóis eram passados         - Passados 5 dias após as “perigosas cousas do mar”

Que dali nos partíramos, cortando             

Os mares nunca doutrem navegados,       - A viagem decorria tranquilamente

Prósperamente os ventos assoprando,      - Aparecimento de uma nuvem escura

Quando uma noite estando descuidados, 

Na cortadora proa vigiando,

Uma nuvem que os ares escurece 

Sobre nossas cabeças aparece.

.

"Tão temerosa vinha e carregada,     - A nuvem escura que apareceu vinha tão carregada que  encheu de medo os navegantes.

Que pôs nos corações um grande medo;     

Bramindo o negro mar, de longe brada       

Como se desse em vão nalgum rochedo.   - O mar ao longe fazia grande ruído ao bater contra os rochedos.

- "Ó Potestade, disse, sublimada!                  

Que ameaço divino, ou que segredo            - Gama aterrorizado pergunta à tempestade o que ela era, que lhe parecia mais que uma simples tormenta.

Este clima e este mar nos apresenta,        

Que mor cousa parece que tormenta?" -

.

"Não acabava, quando uma figura     - Gama ainda não tinha acabado de falar quando lhe apareceu uma figura

Se nos mostra no ar, robusta e válida,        

De disforme e grandíssima estatura,         - Figura horrenda, intimidadora, de proporções enormes

O rosto carregado, a barba esquálida,         

Os olhos encovados, e a postura

Medonha e má, e a cor terrena e pálida,

Cheios de terra e crespos os cabelos,

A boca negra, os dentes amarelos.

.

"Tão grande era de membros, que bem posso  - A figura era tão grande que poder-se-ia jurar ser ela o segundo Colosso de Rodes (Comparação)

Certificar-te, que este era o segundo                

De Rodes estranhíssimo Colosso,                      

Que um dos sete milagres foi do mundo:

Com um tom de voz nos fala horrendo e grosso,

Que pareceu sair do mar profundo:

Arrepiam-se as carnes e o cabelo    →    O medo instalou-se por o Adamastor ser tão grande e ter a voz tão grossa a horrenda

A mi e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo.

.

Invocação - O gigante chama os portugueses de ousados (atrevidos) e diz que nunca repousam. Diz que aquele mar que há tanto ele guarda nunca foi conhecido por outros

.

"E disse: — "Ó gente ousada, mais que quantas  

No mundo cometeram grandes cousas,               

Tu, que por guerras cruas, tais e tantas,             

E por trabalhos vãos nunca repousas,              

Pois os vedados términos quebrantas,                  

E navegar meus longos mares ousas,

Que eu tanto tempo há já que guardo e tenho,     Anástrofe Ou Hipérbato

Nunca arados d'estranho ou próprio lenho;

.

- "Pois vens ver os segredos escondidos     - Já que os portugueses descobriram os segredos do mar, o gigante ordena-lhes que ouçam os sofrimentos futuros, consequência do atrevimento de cruzar os mares.

Da natureza e do úmido elemento,               

A nenhum grande humano concedidos          

De nobre ou de imortal merecimento,          

Ouve os danos de mim, que apercebidos    

Estão a teu sobejo atrevimento,

Por todo o largo mar e pela terra,   Todos os danos que ele fizer serão por mar e terra

Que ainda hás de sojugar com dura guerra.    → Está a prever o futuro dos portugueses

.

Sentido de futuro

.

- "Sabe que quantas naus esta viagem 

Que tu fazes, fizerem de atrevidas,         - Os navios que fizerem esta viagem terão aquele cabo como inimigo

Inimiga terão esta paragem                        

Com ventos e tormentas desmedidas.

E da primeira armada que passagem

Fizer por estas ondas insofridas,

Eu farei d'improviso tal castigo,

Que seja mor o dano que o perigo.     O perigo vai ser enorme devido ao atrevimento dos portugueses

.

- "Aqui espero tomar, se não me engano, 

De quem me descobriu, suma vingança.

E não se acabará só nisto o dano 

Da vossa pertinace confiança;

Antes em vossas naus vereis cada ano,

Se é verdade o que meu juízo alcança,

Naufrágios, perdições de toda sorte,

Que o menor mal de todos seja a morte.

.

- "É do primeiro Ilustre, que a ventura

Com fama alta fizer tocar os Céus,

Serei eterna e nova sepultura,

Por juízos incógnitos de Deus.

Aqui porá da Turca armada dura

Os soberbos e prósperos troféus;

Comigo de seus danos o ameaça

A destruída Quíloa com Mombaça.

.

- "Outro também virá de honrada fama,

Liberal, cavaleiro, enamorado,

E consigo trará a formosa dama

Que Amor por grã mercê lhe terá dado.

Triste ventura e negro fado os chama

Neste terreno meu, que duro e irado

Os deixará dum cru naufrágio vivos

Para verem trabalhos excessivos.

.

- "Verão morrer com fome os filhos caros,

Em tanto amor gerados e nascidos;

Verão os Cafres ásperos e avaros

Tirar à linda dama seus vestidos;

Os cristalinos membros e perclaros

A calma, ao frio, ao ar verão despidos,

Depois de ter pisada longamente

Co'os delicados pés a areia ardente.

.

- "E verão mais os olhos que escaparem

De tanto mal, de tanta desventura,

Os dois amantes míseros ficarem

Na férvida e implacável espessura.

Ali, depois que as pedras abrandarem

Com lágrimas de dor, de mágoa pura,

Abraçados as almas soltarão

Da formosa e misérrima prisão." -

.

"Mais ia por diante o monstro horrendo

Dizendo nossos fados, quando alçado

Lhe disse eu: — Quem és tu? que esse estupendo

Corpo certo me tem maravilhado.-

A boca e os olhos negros retorcendo,

E dando um espantoso e grande brado,

Me respondeu, com voz pesada e amara,

Como quem da pergunta lhe pesara:

.

- "Eu sou aquele oculto e grande Cabo,

A quem chamais vós outros Tormentório,

Que nunca a Ptolomeu, Pompónio, Estrabo,

Plínio, e quantos passaram, fui notório.

Aqui toda a Africana costa acabo

Neste meu nunca visto Promontório,

Que para o Pólo Antarctico se estende,

A quem vossa ousadia tanto ofende.

.

- "Fui dos filhos aspérrimos da Terra,

Qual Encélado, Egeu e o Centimano;

Chamei-me Adamastor, e fui na guerra

Contra o que vibra os raios de Vulcano;

Não que pusesse serra sobre serra,

Mas conquistando as ondas do Oceano,

Fui capitão do mar, por onde andava

A armada de Netuno, que eu buscava.

.

Após a análise do episódio, explique de que modo se procede à mitificação do herói.

A epopeia Os Lusíadas mostra a história do povo que teve a ousadia da aventura marítima e a intenção em exaltar os heróis que construíram e alargaram o Império.

Os navegantes e, em especial, Vasco da Gama, ultrapassaram a sua individualidade do herói colectivo (povo). São símbolos do heroísmo lusíada, do seu espírito de aventura e da capacidade de vivência cosmopolita.

A viagem exprime a passagem do desconhecido para o conhecido, ou seja, da realidade do Velho Continente e dos seus mitos indefinidos para novas realidades de uma planeta a descobrir.

Camões, ao contrário dos épicos anteriores, escolheu um herói colectivo, procurando que a sua epopeia anunciasse a história de todo o povo, afirmando que todos os navegantes que chegaram à Índia e todos os heróis lusíadas merecem a mitificação.

Nega a existência de deuses, dizendo que estes são criação do homem para tentar explicar o que lhes parece difícil de explicar.

 

Canto V (92-100)

Reflexão sobre o desprezo a que as artes e as letras são muitas vezes votadas pelos portugueses.

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Quão doce é o louvor e a justa glória

Dos próprios feitos, quando são soados!

Qualquer nobre trabalha que em memória

Vença ou iguale os grandes já passados.

As invejas da ilustre e alheia história

Fazem mil vezes feitos sublimados.

Quem valerosas obras exercita,

Louvor alheio muito o esperta e incita.

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Não tinha em tanto os feitos gloriosos

De Aquiles, Alexandro na peleja,

Quanto de quem o canta, os numerosos

Versos; isso só louva, isso deseja.

Os troféus de Melcíades famosos

Temístoeles despertam só de inveja,

E diz que nada tanto o deleitava

Como a voz que seus feitos celebrava.

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Trabalha por mostrar Vasco da Gama

Que essas navegações que o mundo canta

Não merecem tamanha glória e fama

Como a sua, que o céu e a terra espanta.

Si; mas aquele Herói, que estima e ama

Com dons, mercês,. favores e honra tanta

A lira Mantuana, faz que soe

Eneias, e a Romana glória voe.

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Dá a terra lusitana Cipiões,

Césares, Alexandros, e dá Augustos;

Mas não lhe dá contudo aqueles dois

Cuja falta os faz duros e robustos.

Octávio, entre as maiores opressões,

Compunha versos doutos e venustos.

Não dirá Fúlvia certo que é mentira,

Quando a deixava António por Glafira,

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Vai César, sojugando toda França, 

E as armas não lhe impedem a ciência; 

Mas , numa mão a pena e noutra a lança, 

Igualava de Cícero a eloquência.

O que de Cipião se sabe e alcança, 

É nas comédias grande experiência.

Lia Alexandro a Homero de maneira 

Que sempre se lhe sabe à cabeceira.

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Enfim, não houve forte capitão,

Que não fosse também douto e ciente,

Da Lácia, Grega, ou Bárbara nação,

Senão da Portuguesa tão somente.

Sem vergonha o não digo, que a razão

De algum não ser por versos excelente,

É não se ver prezado o verso e rima,

Porque, quem não sabe arte, não na estima.

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Por isso, e não por falta de natura,

Não há também Virgílios nem Homeros;

Nem haverá, se este costume dura,

Pios Eneias, nem Aquiles feros.

Mas o pior de tudo é que a ventura

Tão ásperos os fez, e tão austeros,

Tão rudos, e de engenho tão remisso,

Que a muitos lhe dá pouco, ou nada disso.

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As Musas agradeça o nosso Gama

o Muito amor da Pátria, que as obriga

A dar aos seus na lira nome e fama

De toda a ilustro e bélica fadiga:

Que ele, nem quem na estirpe seu se chama,

Calíope não tem por tão amiga,

Nem as filhas do Tejo, que deixassem

As telas douro fino, e que o cantassem.

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Porque o amor fraterno e puro gosto

De dar a todo o Lusitano feito

Seu louvor, é somente o pressuposto

Das Tágides gentis, e seu respeito.

Porém não deixe enfim de ter disposto

Ninguém a grandes obras sempre o peito,

Que por esta, ou por outra qualquer via,

Não perderá seu preço, e sua valia.

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Canto VI (92-100)

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Já a manhã clara dava nos outeiros

Por onde o Ganges murmurando soa,

Quando da celsa gávea os marinheiros

Enxergaram terra alta pela proa.

Já fora de tormenta, e dos primeiros

Mares, o temor vão do peito voa.

Disse alegre o piloto Melindano:

"Terra é de Calecu, se não me engano.

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"Esta é por certo a terra que buscais

Da verdadeira Índia, que aparece;

E se do mundo mais não desejais,

Vosso trabalho longo aqui fenece."

Sofrer aqui não pode o Gama mais,

De ledo em ver que a terra se conhece:

Os geolhos no chão, as mãos ao céu,

A mercê grande a Deus agradeceu.

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As graças a Deus dava, e razão tinha,

Que não somente a terra lhe mostrava,

Que com tanto temor buscando vinha,

Por quem tanto trabalho experimentava;

Mas via-se livrado tão asinha

Da morte, que no mar lhe aparelhava

O vento duro, fervido e medonho,

Como quem despertou de horrendo sonho.

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Por meio destes hórridos perigos,           “A imortalidade” o valor da glória e das honras por mérito próprio

Destes trabalhos graves e temores,        

Alcançam os que são de fama amigos       Estas estrofes finais constituem um elogio aos heroicos marinheiros que, depois de enfrentarem tantos perigos e temores, levam a bom porto a realização da missão que lhes havia sido confiada.

As honras imortais e graus maiores:       

Não encostados sempre nos antigos        

Troncos nobres de seus antecessores;     

Não nos leitos dourados, entre os finos

Animais de Moscóvia zebelinos;

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Não com os manjares novos e esquisitos,

Não com os passeios moles e ociosos,

Não com os vários deleites e infinitos,

Que afeminam os peitos generosos,

Não com os nunca vencidos apetitos

Que a Fortuna tem sempre tão mimosos,

Que não sofre a nenhum que o passo mude

Para alguma obra heróica de virtude;

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Mas com buscar com o seu forçoso braço      Seguidamente, Camões enuncia um conjunto de renúncias e atos que devem praticar todos aqueles que quiserem alcançar a fama e a glória, ou seja, a imortalidade, como é o caso do caminho da virtude e do desprezo das honras e do dinheiro.

As honras, que ele chame próprias suas;      

Vigiando, e vestindo o forjado aço,               

Sofrendo tempestades e ondas cruas;          

Vencendo os torpes frios no regaço             

Do Sul e regiões de abrigo nuas;                       

Engolindo o corrupto mantimento,                

Temperado com um árduo sofrimento;

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E com forçar o rosto, que se enfia,

A parecer seguro, ledo, inteiro,

Para o pelouro ardente, que assovia

E leva a perna ou braço ao companheiro.

Destarte, o peito um calo honroso cria,

Desprezador das honras e dinheiro,

Das honras e dinheiro, que a ventura

Forjou, e não virtude justa e dura.

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Destarte se esclarece o entendimento,

Que experiências fazem repousado,

E fica vendo, corno de alto assento,

O baixo trato humano embaraçado.

Este, onde tiver força o regimento

Direito, e não de afeitos ocupado,

Subirá (como deve) a ilustre mando,

Contra vontade sua, e não rogando.

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Canto VII (78-87)

Reflexão sobre a ingratidão de que o Poeta se sente alvo por parte da sociedade. 

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Um ramo na mão tinha... Mas, ó cego! 

Eu, que cometo insano e temerário, 

Sem vós, Ninfas do Tejo e do Mondego, 

Por caminho tão árduo, longo e vário! 

Vosso favor invoco, que navego 

Por alto mar, com vento tão contrário, 

Que, se não me ajudais, hei grande medo 

Que o meu fraco batel se alague cedo. 

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Olhai que há tanto tempo que, cantando 

O vosso Tejo e os vossos Lusitanos, 

A fortuna mo traz peregrinando, 

Novos trabalhos vendo, e novos danos: 

Agora o mar, agora experimentando 

Os perigos Mavórcios inumanos, 

Qual Canace, que à morte se condena, 

Numa mão sempre a espada, e noutra a pena. 

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Agora, com pobreza avorrecida, 

Por hospícios alheios degradado; 

Agora, da esperança já adquirida, 

De novo, mais que nunca, derribado; 

Agora às costas escapando a vida, 

Que dum fio pendia tão delgado 

Que não menos milagre foi salvar-se 

Que para o Rei Judaico acrescentar-se. 

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E ainda, Ninfas minhas, não bastava 

Que tamanhas misérias me cercassem, 

Senão que aqueles, que eu cantando andava 

Tal prémio de meus versos me tornassem:

A troco dos descansos que esperava, 

Das capelas de louro que me honrassem, 

Trabalhos nunca usados me inventaram, 

Com que em tão duro estado me deitaram. 

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Vede, Ninfas, que engenhos de senhores 

O vosso Tejo cria valorosos, 

Que assim sabem prezar com tais favores 

A quem os faz, cantando, gloriosos! 

Que exemplos a futuros escritores, 

Para espertar engenhos curiosos, 

Para porem as coisas em memória, 

Que merecerem ter eterna glória! 

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Pois logo em tantos males é forçado, 

Que só vosso favor me não faleça, 

Principalmente aqui, que sou chegado 

Onde feitos diversos engrandeça: 

Dai-mo vós sós, que eu tenho já jurado 

Que não o empregue em quem o não mereça, 

Nem por lisonja louve algum subido, 

Sob pena de não ser agradecido. 

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Nem creiais, Ninfas, não, que a fama desse

A quem ao bem comum e do seu Rei

Antepuser seu próprio interesse,

Inimigo da divina e humana Lei. 

Nenhum ambicioso, que quisesse 

Subir a grandes cargos, cantarei, 

Só por poder com torpes exercícios 

Usar mais largamente de seus vícios; 

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Nenhum que use de seu poder bastante,

Para servir a seu desejo feio, 

E que, por comprazer ao vulgo errante, 

Se muda em mais figuras que Proteio. 

Nem, Camenas, também cuideis que canto 

Quem, com hábito honesto e grave, veio, 

Por contentar ao Rei no ofício novo, 

A despir e roubar o pobre povo. 

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Nem quem acha que é justo e que é direito 

Guardar-se a lei do Rei severamente, 

E não acha que é justo e bom respeito, 

Que se pague o suor da servil gente; 

Nem quem sempre, com pouco experto peito, 

Razões aprende, e cuida que é prudente, 

Para taxar, com mão rapace e escassa, 

Os trabalhos alheios, que não passa. 

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Aqueles sós direi, que aventuraram 

Por seu Deus, por seu Rei, a amada vida,

Onde, perdendo-a, em fama a dilataram,

Tão bem de suas obras merecida. 

Apolo, e as Musas que me acompanharam, 

Me dobrarão a fúria concedida, 

Enquanto eu tomo alento descansado,

Por tornar ao trabalho, mais folgado.

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Canto VIII (94-99)

Reflexão sobre o poder corrupto do ouro, o “metal luzente e louro”, motor de traições

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Vem a fazenda a terra, aonde logo 

A agasalhou o infame Catual; 

Com ela ficam Álvaro e Diogo, 

Que a pudessem vender pelo que val. 

Se mais que obrigação, que mando e rogo 

No peito vil o prémio pode e val, 

Bem o mostra o Gentio a quem o entenda, 

Pois o Gama soltou pela fazenda. 

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Por ela o solta, crendo que ali tinha 

Penhor bastante, donde recebesse 

Interesse maior do que lhe vinha, 

Se o Capitão mais tempo detivesse. 

Ele, vendo que já lhe não convinha 

Tornar a terra, por que não pudesse 

Ser mais retido, sendo às naus chegado 

Nelas estar se deixa descansado. 

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Nas naus estar se deixa vagaroso, 

Até ver o que o tempo lhe descobre: 

Que não se fia já do cobiçoso 

Regedor corrompido e pouco nobre. 

Veja agora o juízo curioso 

Quanto no rico, assim como no pobre, 

Pode o vil interesse e sede inimiga 

Do dinheiro, que a tudo nos obriga. 

A Polidoro mata o Ptei Treício, 

Só por ficar senhor do grão tesouro; 

Entra, pelo fortíssimo edifício, 

Com a filha de Acriso a chuva d'ouro; 

Pode tanto em Tarpeia avaro vício, 

Que, a troco do metal luzente e louro, 

Entrega aos inimigos a alta torre, 

Do qual quase afogada em pago morre. 

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Este rende munidas fortalezas, 

Faz tredores e falsos os amigos: 

Este a mais nobres faz fazer vilezas, 

E entrega Capitães aos inimigos; 

Este corrompe virginais purezas, 

Sem temer de honra ou fama alguns perigos: 

Este deprava às vezes as ciências, 

Os juízos cegando e as consciências; 

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Este interpreta mais que sutilmente. 

Os textos; este faz e desfaz leis; 

Este causa os perjúrios entre a gente, 

E mil vezes tiranos torna os Reis. 

Até os que só a Deus Onipotente 

Se dedicam, mil vezes ouvireis 

Que corrompe este encantador, e ilude; 

Mas não sem cor, contudo, de virtude.

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Plano do poeta:

  • Canto I (105-106) - Camões reflete sobre a fragilidade e a bravicidade da vida do “bicho da terra tão pequeno”
  • Canto V (92-100) - Elogia os feitos dos portugueses dos quais sente orgulho e sobrevaloriza-os em relação a feitos grandiosos de outros povos / Censura, critica e lamenta o desprezo a que as artes e nomeadamente a poesia, são sujeitos
  • Canto VI (95-99) - Reflete sobre o valor dos portugueses que não repousam à sombra dos feitos antigos – a sua honra e fama advém dos feitos presentes através dos quais alcançam a imortalidade / Elogia a persistência do povo português que não para diante de nada
  • Canto VII (78-87) - Reflexão sobre a ingratidão de que o poeta se sente alvo por parte da sociedade.
  • Canto VIII (96-99) Reflexão sobre o poder corrupto do ouro, o “metal luzente e louro”, motor de traições.
  • Canto IX (93-95) - Reflexão sobre (o)s modo(s) de atingir a imortalidade, condenando a cobiça, e ambição e a tirania.
  • Canto X (145-156) - Reflexão sobre a decadência da pátria. Invectiva o Rei D. Sebastião renovando os apelos veiculados na Dedicatória, incentivando-o a tomar medidas no sentido de recolocar a nação no caminho do êxito, favorecendo todos aqueles que estejam dispostos a servi-la desinteressadamente e conclui a sua obra oferecendo-se para cantar os feitos que o Rei venha a realizar em África. Camões lamenta ainda perante a musa Calíope da inutilidade do seu canto face à indiferença da sociedade do seu tempo (“gente surda e endurecida”), afogada no “gosto da cobiça e na rudeza/duma “austera, apagada e vil tristeza”.
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Episódio da Ilha dos Amores - Canto IX (16-30)

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Apartadas assim da ardente costa             As naus estão de regresso à Costa

As venturosas naus, levando a proa 

Para onde a Natureza tinha posta             Os navegadores fazem-se acompanhar  de notícias da Índia e vão novamente passar pelos mesmos medos, situações

A meta Austrina da esperança boa,         

Levando alegres novas e resposta         

Da parte Oriental para Lisboa, 

Outra vez cometendo os duros medos 

Do mar incerto, tímidos e ledos   → Hipálage

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O prazer de chegar à pátria cara, 

A seus penates caros e parentes,              Querem voltar para casa para contarem  tudo o que passaram e para ganhar o prémio. O entusiasmo é tanto e tão grande que o coração é pequeno para que tudo lá caiba.

Para contar a peregrina e rara                 

Navegação, os vários céus e gentes;        

Vir a lograr o prémio, que ganhara             

Por tão longos trabalhos e acidentes,        

Cada um tem por gosto tão perfeito, 

Que o coração para ele é vaso estreito. 

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Porém a deusa Cípria, que ordenada 

Era para favor dos Lusitanos 

Do Padre eterno, e por bom génio dada,          Como Vénus estava do lado dos portugueses por ordem de Júpiter prepara-lhes uma devida recompensa.

Que sempre os guia já de longos anos;         

A glória por trabalhos alcançada,                 

Satisfação de bem sofridos danos, 

Lhe andava já ordenando, e pretendia 

Dar-lhe nos mares tristes alegria. 

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Depois de ter um pouco revolvido 

Na mente o largo mar que navegaram, 

Os trabalhos, que pelo Deus nascido 

Nas Anfióneas Tebas se causaram; 

Já trazia de longe no sentido, 

Para prémio de quanto mal passaram, 

Buscar-lhe algum deleite, algum descanso 

No Reino de cristal líquido e manso; 

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Algum repouso, enfim, com que pudesse 

Refocilar a lassa humanidade 

Dos navegantes seus, como interesse 

Do trabalho que encurta a breve idade. 

Parece-lhe razão que conta desse 

A seu filho, por cuja potestade 

Os Deuses faz descer ao vil terreno 

E os humanos subir ao céu sereno. 

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Isto bem revolvido, determina 

De ter-lhe aparelhada, lá no meio 

Das águas, alguma ínsula divina, 

Ornada de esmaltado e verde arreio; 

Que muitas tem no reino, que confina 

Da mãe primeira com o terreno seio, 

Afora as que possui soberanas 

Para dentro das portas Herculanas. 

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Ali quer que as aquáticas donzelas 

Esperem os fortíssimos barões, 

Todas as que têm título de belas, 

Glória dos olhos, dor dos corações, 

Com danças e coreias, porque nelas 

Influirá secretas afeições, 

Para com mais vontade trabalharem 

De contentar, a quem se afeiçoaram. 

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Tal manha buscou já, para que aquele 

Que de Anquises pariu, bem recebido 

Fosse no campo que a bovina pele 

Tomou de espaço, por subtil partido. 

Seu filho vai buscar, porque só nele 

Tem todo seu poder, fero Cupido, 

Que assim como naquela empresa antiga 

Ajudou já, nestoutra a ajude e siga. 

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No carro ajunta as aves que na vida 

Vão da morte as exéquias celebrando,

E aquelas em que já foi convertida 

Perístera, as boninas apanhando. 

Em derredor da Deusa já partida, 

No ar lascivos beijos se vão dando. 

Ela, por onde passa, o ar e o vento 

Sereno faz, com brando movimento. 

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Já sobre os Idálios montes pende, 

Onde o filho frecheiro estava então 

Ajuntando outros muitos, que pretende 

Fazer uma famosa expedição 

Contra o mundo rebelde, por que emende 

Erros grandes, que há dias nele estão, 

Amando coisas que nos foram dadas, 

Não para ser amadas, mas usadas. 

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Via Acteon na caça tão austero, 

De cego na alegria bruta, insana, 

Que por seguir um feio animal fero, 

Foge da gente e bela forma humana; 

E por castigo quer, doce e severo, 

Mostrar-lhe a formosura de Diana; 

E guarde-se não seja ainda comido 

Desses cães que agora ama, e consumido. 

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E vê do mundo todo os principais, 

Que nenhum no bem público imagina; 

Vê neles que não têm amor a mais 

Que a si somente, e a quem Filáucia ensina. 

Vê que esses que frequentam os reais 

Paços, por verdadeira e sã doutrina 

Vendem adulação, que mal consente 

Mondar-se o novo trigo florescente. 

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Vê que aqueles que devem à pobreza 

Amor divino e ao povo caridade, 

Amam somente mandos e riqueza, 

Simulando justiça e integridade. 

Da feia tirania e de aspereza 

Fazem direito e vã severidade: 

Leis em favor do Rei se estabelecem, 

As em favor do povo só perecem. 

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Vê, enfim, que ninguém ama o que deve, 

Senão o que somente mal deseja; 

Não quer que tanto tempo se releve 

O castigo, que duro e justo seja. 

Seus ministros ajunta, por que leve 

Exércitos conformes à peleja, 

Que espera ter com a mal regida gente, 

Que lhe não for agora obediente. 

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Muitos destes meninos voadores 

Estão em várias obras trabalhando: 

Uns amolando ferros passadores, 

Outros ásteas de setas delgaçando; 

Trabalhando, cantando estão de amores, 

Vários casos em verso modulando, 

Melodia sonora e concertada, 

Suave a letra, angélica a soada. 

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Episódio da Ilha dos Amores - Canto IX (64-74)

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Nesta frescura tal desembarcavam 

Já das naus os segundos Argonautas,       Desembarcam os portugueses na Ilha dos Amores

Onde pela floresta se deixavam

Andar as belas Deusas, como incautas. 

Algumas doces cítaras tocavam,             A Ilha era habitada de Ninfas

Algumas harpas e sonoras flautas, 

Outras com os arcos de ouro se fingiam 

Seguir os animais, que não seguiam. 

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Assim lho aconselhara a mestra experta; 

Que andassem pelos campos espalhadas;     Vénus aconselhou as Deusas a que andassem espalhadas pelos campos desnudadas como se desprevenidas  para que chamassem a atenção dos barões

Que, vista dos barões a presa incerta,

Se fizessem primeiro desejadas.

Algumas, que na forma descoberta            

Do belo corpo estavam confiadas,

Posta a artificiosa formosura, 

Nuas lavar-se deixam na água pura, 

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Mas os fortes mancebos, que na praia 

Punham os pés, de terra cobiçosos, 

Que não há nenhum deles que não saia            Os homens tinham o desejo de pisar terra firme, com o objectivo de descansar, caçar e obter água potável

De acharem caça agreste desejosos,            

Não cuidam que, sem laço ou redes, caia     

Caça naqueles montes deleitosos, 

Tão suave, doméstica e benigna, 

Qual ferida lha tinha já Ericina. 

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Alguns, que em espingardas e nas bestas, 

Para ferir os cervos se fiavam, 

Pelos sombrios matos e florestas 

Determinadamente se lançavam: 

Outros, nas sombras, que de as altas sestas 

Defendem a verdura, passeavam 

Ao longo da água que, suave e queda, 

Por alvas pedras corre à praia leda. 

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Começam de enxergar subitamente 

Por entre verdes ramos várias cores, 

Cores de quem a vista julga e sente            Os marinheiros começam-se a aperceber de determinadas cores que não eram típicas da vegetação verificando que se tratava de Deusas

Que não eram das rosas ou das flores,       

Mas da lã fina e seda diferente,              

Que mais incita a força dos amores,         

De que se vestem as humanas rosas, 

Fazendo-se por arte mais formosas. 

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Dá Veloso espantado um grande grito: 

"Senhores, caça estranha, disse, é esta! 

Se ainda dura o Gentio antigo rito, 

A Deusas é sagrada esta floresta.                  Ficam espantados ao ver as Deusas

Mais descobrimos do que humano espírito 

Desejou nunca; e bem se manifesta 

Que são grandes as coisas e excelentes, 

Que o mundo encobre aos homens imprudentes. 

.

"Sigamos estas Deusas, e vejamos 

Se fantásticas são, se verdadeiras." 

Isto dito, velozes mais que gamos,                 Os portugueses resolvem começar a seguir as Ninfas para verificar se as Deusas eram verdadeiras ou fantásticas

Se lançam a correr pelas ribeiras.             

Fugindo as Ninfas vão por entre os ramos, 

Mas, mais industriosas que ligeiras, 

Pouco e pouco sorrindo e gritos dando, 

Se deixam ir dos galgos alcançando. 

.

De ua os cabelos de ouro o vento leva 

Correndo, e de outra as fraldas delicadas; 

Acende-se o desejo, que se ceva 

Nas alvas carnes súbito mostradas; 

Uma de indústria cai, e já releva, 

Com mostras mais macias que indignadas, 

Que sobre ela, empecendo, também caia 

Quem a seguiu pela arenosa praia. 

.

Outros, por outra parte, vão topar 

Com as Deusas despidas, que se lavam: 

Elas começam súbito a gritar, 

Como que assalto tal não esperavam. 

Umas, fingindo menos estimar 

A vergonha que a força, se lançavam 

Nuas por entre o mato, aos olhos dando 

O que às mãos cobiçosas vão negando. 

.

Outra, como acudindo mais depressa 

A vergonha da Deusa caçadora, 

Esconde o corpo n'água; outra se apressa 

Por tomar os vestidos, que tem fora. 

Tal dos mancebos há, que se arremessa, 

Vestido assim e calçado (que, coa mora 

De se despir, há medo que ainda tarde) 

A matar na água o fogo que nele arde. 

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Qual cão de caçador, sagaz e ardido, 

Usado a tomar na água a ave ferida, 

Vendo no rosto o férreo cano erguido 

Para a garcenha ou pata conhecida, 

Antes que soe o estouro, mal sofrido 

Salta n'água, e da presa não duvida, 

Nadando vai e latindo: assim o mancebo 

Remete à que não era irmã de Febo.    

.      

Canto IX (83-95)

Reflexão sobre o(s) modo(s) de atingir a imortalidade, condenando a cobiça, a ambição e a tirania.

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Oh, que famintos beijos na floresta, 

E que mimoso choro que soava! 

Que afagos tão suaves!  Que ira honesta, 

Que em risinhos alegres se tornava! 

O que mais passam na manhã, e na sesta, 

Que Vénus com prazeres inflamava, 

Melhor é experimentá-lo que julgá-lo; 

Mas julgue-o quem não pode experimentá-lo. 

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Desta arte enfim conformes já as formosas 

Ninfas com os seus amados navegantes, 

Os ornam de capelas deleitosas 

De louro, e de ouro, e flores abundantes. 

As mãos alvas lhes davam como esposas; 

Com palavras formais e estipulantes 

Se prometem eterna companhia 

Em vida e morte, de honra e alegria. 

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Uma delas maior, a quem se humilha 

Todo o coro das Ninfas, e obedece, 

Que dizem ser de Celo e Vesta filha, 

O que no gesto belo se parece, 

Enchendo a terra e o mar de maravilha, 

O Capitão ilustre, que o merece, 

Recebe ali com pompa honesta e régia, 

Mostrando-se senhora grande e egrégia. 

.

Que, depois de lhe ter dito quem era, 

Com um alto exórdio, de alta graça ornado, 

Dando-lhe a entender que ali viera 

Por alta influição do imóvel fado, 

Para lhe descobrir da unida esfera 

Da terra imensa, e mar não navegado, 

Os segredos, por alta profecia, 

O que esta sua nação só merecia, 

.

Tomando-o pela mão, o leva e guia 

Para o cume dum monte alto e divino, 

No qual uma rica fábrica se erguia 

De cristal toda, e de ouro puro e fino. 

A maior parte aqui passam do dia 

Em doces jogos e em prazer contino: 

Ela nos paços logra seus amores, 

As outras pelas sombras entre as flores. 

.

Assim a formosa e a forte companhia 

O dia quase todo estão passando, 

Numa alma, doce, incógnita alegria, 

Os trabalhos tão longos compensando. 

Porque dos feitos grandes, da ousadia 

Forte e famosa, o mundo está guardando 

O prémio lá no fim, bem merecido, 

Com fama grande e nome alto e subido. 

.

Que as Ninfas do Oceano tão formosas, 

Tethys, e a ilha angélica pintada, 

Outra coisa não é que as deleitosas 

Honras que a vida fazem sublimada. 

Aquelas proeminências gloriosas, 

Os triunfos, a fronte coroada 

De palma e louro, a glória e maravilha: 

Estes são os deleites desta ilha. 

.

Que as imortalidades que fingia 

A antiguidade, que os ilustres ama, 

Lá no estelante Olimpo, a quem subia 

Sobre as asas ínclitas da Fama, 

Por obras valorosas que fazia, 

Pelo trabalho imenso que se chama 

Caminho da virtude alto e fragoso, 

Mas no fim doce, alegre e deleitoso: 

.

Não eram senão prémios que reparte 

Por feitos imortais e soberanos 

O mundo com os varões, que esforço e arte 

Divinos os fizeram, sendo humanos. 

Que Júpiter, Mercúrio, Febo e Marte, 

Eneias e Quirino, e os dois Tebanos, 

Ceres, Palas e Juno, com Diana, 

Todos foram de fraca carne humana. 

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Mas a Fama, trombeta de obras tais, 

Lhe deu no mundo nomes tão estranhos 

De Deuses, Semideuses imortais, 

Indígetes, Heróicos e de Magnos. 

Por isso, ó vós que as famas estimais, 

Se quiserdes no mundo ser tamanhos, 

Despertai já do sono do ócio ignavo, 

Que o ânimo de livre faz escravo. 

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Reflexão sobre o(s) modo(s) de atingir a imortalidade, condenando a cobiça, a ambição e a tirania. (Últimos três versos)

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E ponde na cobiça um freio duro, 

E na ambição também, que indignamente 

Tomais mil vezes, e no torpe e escuro 

Vício da tirania infame e urgente; 

Porque essas honras vãs, esse ouro puro 

Verdadeiro valor não dão à gente: 

Melhor é, merecê-los sem os ter, 

Que possuí-los sem os merecer. 

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Ou dai na paz as leis iguais, constantes, 

Que aos grandes não dêem o dos pequenos; 

Ou vos vesti nas armas rutilantes, 

Contra a lei dos inimigos Sarracenos: 

Fareis os Reinos grandes e possantes, 

E todos tereis mais, o nenhum menos; 

Possuireis riquezas merecidas, 

Com as honras, que ilustram tanto as vidas. 

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E fareis claro o Rei, que tanto amais, 

Agora com os conselhos bem cuidados, 

Agora com as espadas, que imortais 

Vos farão, como os vossos já passados; 

Impossibilidades não façais, 

Que quem quis sempre pôde; e numerados 

Sereis entre os Heróis esclarecidos, 

E nesta Ilha de Vénus recebidos.

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Episódio Simbólico da Ilha dos Amores

É um episódio do carácter simbólico, na medida em que representa a recompensa e os prémios que são devidos e merecidos por todos quantos buscaram a fama e a glória, em nome da pátria, passando por perigos e sacrifícios para alcançar o seu sonho.

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Canto X (142-157)

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"Até'aqui Portugueses concedido 

Vos é saberdes os futuros feitos 

Que, pelo mar que já deixais sabido, 

Virão fazer barões de fortes peitos. 

Agora, pois que tendes aprendido 

Trabalhos que vos façam ser aceitos 

As eternas esposas e fermosas, 

Que coroas vos tecem gloriosas, 

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"Podeis-vos embarcar, que tendes vento

E mar tranquilo, pera a pátria amada."

Assi lhe disse; e logo movimento

Fazem da Ilha alegre e namorada.

Levam refresco e nobre mantimento;

Levam a companhia desejada

Das Ninfas, que hão-de ter eternamente, 

Por mais tempo que o Sol o mundo aquente. 

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Assi foram cortando o mar sereno,

Com vento sempre manso e nunca irado,

Até que houveram vista do terreno

Em que naceram, sempre desejado.

Entraram pela foz do Tejo ameno,

E à sua pátria e Rei temido e amado 

O prémio e glória dão por que mandou,

E com títulos novos se ilustrou. 

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Reflexão sobre a decadência da pátria. Invectiva o Rei D. Sebastião renovando os apelos veiculados na Dedicatória, incentivando-o a tomar medidas no sentido de recolocar a nação no caminho do êxito, favorecendo todos aqueles que estejam dispostos a servi-lo desinteressadamente e conclui a sua obra oferecendo-se para cantar os feitos que o Rei venha a realizar em África. Camões lamenta ainda perante a musa Calíope da inutilidade do seu canto face à indiferença da sociedade do seu tempo. (“gente surda e endurecida”), afogada no “gosto da cobiça e na rudeza/duma “austera, apagada e vil tristeza”. (últimos dois versos)

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Nô mais, Musa, nô mais, que a Lira tenho

Destemperada e a voz enrouquecida,

E não do canto, mas de ver que venho

Cantar a gente surda e endurecida.

O favor com que mais se acende o engenho

Não no dá a pátria, não, que está metida

No gosto da cobiça e na rudeza

Düa austera, apagada e vil tristeza

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E não sei por que influxo de Destino

Não tem um ledo orgulho e geral gosto,

Que os ânimos levanta de contino

A ter pera trabalhos ledo o rosto. 

Por isso vós, ó Rei, que por divino

Conselho estais no régio sólio posto,

Olhai que sois (e vede as outras gentes)

Senhor só de vassalos excelentes. 



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