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Trabalho sobre a Vida e Obra de Sophia de Mello Breyner Andresen, realizado no âmbito da disciplina de Português (8º ano).
Neste trabalho vou falar sobre a vida de Sophia de Mello Breyner Andresen e uma das suas obras. Escolhi este tema porque acho a autora interessante. Vou explicar o que se passou durante a sua vida e quais as obras que fez durante a sua vida.
Onde nasceu Sophia de Mello Breyner Andresen?
Como foi a sua vida?
Escritora Portuguesa natural do Porto, nasceu em 1919, foi aí que passou a sua infância e a juventude. Têm particular importância as localidades à beira – mar, sobretudo a praia da Granja, muitas vezes evocadas nas sua poesia.
Antes de aprender a ler já sabia de cor versos de Camões e de Antero, e aos doze já escrevia os seus. Fez o ensino secundário no Colégio do Sagrado Coração de Maria, no Porto, mas mudou – se para Lisboa, onde Filologia Clássica e aprendeu a amar o Tejo. Foi casada com o jornalista Francisco Sousa Tavares e mãe de cinco filhos, que a motivaram a escrever contos infantis.
Estreou – se em 1941 com a colaboração em Cadernos de Poesia e em 1944 editou a sua própria colectânea Poesia. Colaborou também em Távola Redonda e Árvore.
Uma formação em Filologia Clássica indica um tema recorrente da sua obra: a civilização grega, enquadrada em Sophia por uma perspectiva humanista cristã. As preocupações de foro social não estão todavia ausentes, sobretudo a partir de Livro Sexto, tendo encontrado evocações do passado para sugerir transformações do futuro; pela sua constante atenção aos problemas do Homem e do Mundo, criou uma literatura de empenhamento social e político, de compromisso com o seu tempo e de denúncia da injustiça e da opressão.
Foi distinguida, em 1999, com o Prémio Camões. Destacam – se ainda na sua obra as narrativas de: O Cavaleiro da Dinamarca, O Rapaz de Bronze, A Fada Oriana, Contos Exemplares e Histórias da Terra e do Mar, e as obras poéticas: No Tempo Dividido, Nome das Coisas, Musa, O Búzio de Cós e Outros Poemas.
Foi também tradutora de Dante Alighieri e de Shakespeare.
Sophia de Mello Breyner Andresen é, sem sombra de dúvida, um dos maiores poetas portugueses contemporâneos – um nome que se transformou, em sinónimo de Poesia e de musa da própria poesia.
Era uma vez uma casa branca nas dunas, voltada para o mar. Tinha uma porta, sete janelas e uma varanda de madeira pintada de verde. Em roda da casa havia um jardim de areia onde cresciam lírios brancos e uma planta que dava flores brancas, amarelas e roxas. Nessa casa morava um rapazito que passava os dias a brincar na praia.
Era uma praia muito grande e quase deserta onde havia rochedos maravilhosos. Mas durante a maré-alta os rochedos estavam cobertos de água. Só se viam as ondas que vinham crescendo do longe até quebrarem na areia com barulho de palmas. Mas na maré vazia as rochas apareciam cobertas de limo, de búzios, de anémonas, de lapas, de algas e de ouriços. Havia poças de água, rios, caminhos, grutas, arcos, cascatas. Havia pedras de todas as cores e feitios, pequeninas e macias, polidas pelas ondas. E a água do mar era transparente e fria. Às vezes passava um peixe, mas tão rápido que mal se via. Dizia-se «Vai ali um peixe» e já não se via nada. Mas as vinagreiras passavam devagar, majestosamente, abrindo e fechando o seu manto roxo. E os caranguejos corriam por todos os lados com uma cara furiosa e um ar muito apressado.
O rapazinho da casa branca adorava as rochas. Adorava o verde das algas, o cheiro da maresia, a frescura transparente das águas. E por isso tinha imensa pena de não ser um peixe para poder ir até ao fundo do mar sem se afogar. E tinha inveja das algas que baloiçavam ao sabor das correntes com um ar tão leve e feliz.
Em Setembro veio o equinócio. Vieram marés vivas, ventanias, nevoeiros, chuvas, temporais. As marés-altas varriam a praia e subiam até à duna. Certa noite, as ondas gritaram tanto, uivaram tanto, bateram e quebraram-se com tanta força na praia, que, no seu quarto caiado da casa branca, o rapazinho esteve até altas horas sem dormir. As portadas das janelas batiam. As madeiras do chão estalavam como madeiras de mastros. Parecia que as ondas iam cercar a casa e que o mar ia devorar o Mundo. E o rapazito pensava que, lá fora, na escuridão da noite, se travava uma imensa batalha em que o mar, o céu e o vento se combatiam. Mas por fim, cansado de escutar, adormeceu embalado pelo temporal.
De manhã quando acordou estava tudo calmo. A batalha tinha acabado. Já não se ouviam os gemidos do vento, nem gritos do mar, mas só um doce murmúrio de ondas pequeninas. E o rapazinho saltou da cama, foi à janela e viu uma manhã linda de sol brilhante, céu azul e mar azul. Estava maré vaza. Pôs o fato de banho e foi para a praia a correr. Tudo estava tão claro e sossegado que ele pensou que o temporal da véspera tinha sido um sonho.
Mas não tinha sido um sonho. A praia estava coberta de espumas deixadas pelas ondas da tempestade. Eram fileiras e fileiras de espiava que tremiam à menor aragem. Pareciam castelos fantásticos, brancos mas cheios de reflexos de mil cores. O rapaz quis tocar-lhes, mas mal punha neles as suas mãos os castelos trémulos desfaziam-se.
Então foi brincar para as rochas. Começou por seguir um fio de água muito claro entre dois grandes rochedos escuros, cobertos de búzios. O rio ia dar a uma grande poça de água onde o rapazinho tomou banho e nadou muito tempo. Depois do banho continuou o seu caminho através das rochas. Ia andando para o sul da praia que era um deserto para onde nunca ninguém ia. A maré estava muito baixa e a manhã estava linda. As algas pareciam mais verdes do que nunca e o mar tinha reflexos lilases. O rapazinho sentia-se tão feliz que às vezes punha-se a dançar em cima dos rochedos. De vez em quando encontrava uma poça boa e tomava outro banho Quando ia já no décimo banho, lembrou-se que deviam ser horas de voltar para casa. Saiu da água e deitou-se numa rocha a apanhar sol.
«Tenho que ir para casa», pensava ele, mas não lhe apetecia nada ir-se embora. E, enquanto assim estava deitado, com a cara encostada às algas, aconteceu de repente uma coisa extraordinária: ouviu uma gargalhada muito esquisita, parecia um pouco uma gargalhada de ópera dada por uma voz de «baixo»: depois ouviu uma segunda gargalhada ainda mais esquisita, uma gargalhada pequenina, seca que parecia uma tosse: em seguida uma terceira gargalhada, que era como se alguém dentro de água fizesse «glu, glu». Mas o mais extraordinário de tudo foi a quarta gargalhada: era como uma gargalhada humana, mas muito mais pequenina, muito mais fina e muito mais clara. Ele nunca tinha ouvido uma voz tão clara: era como se a água ou o vidro se rissem.
Com muito cuidado para não fazer barulho levantou-se e pôs-se a espreitar escondido entre duas pedras. E viu um grande polvo a rir, um caranguejo a rir, um peixe a rir e uma menina muito pequenina a rir também. A menina, que devia medir um palmo de altura, tinha cabelos verdes, olhos roxos e um vestido feito de algas encarnadas. E estavam os quatro numa poça de água muito limpa e transparente toda rodeada de anémonas. E nadavam e riam.
- Oh! Oh! Oh! - ria o polvo.
- Que! Que! Que! - ria o caranguejo.
- Glu! Glu! Glu! - ria o peixe.
Ah! Ah! Ah! - ria a menina.
Depois pararam de rir e a menina disse:
-Agora quero dançar.
Então, num instante, o polvo, o caranguejo e o peixe transformaram-se numa orquestra.
O peixe, com as suas barbatanas, batia palmas na água.
O caranguejo subiu para uma rocha e com as suas tenazes começou a tocar castanholas.
O polvo trepou para cima dos rochedos e esticando muito sete dos seus oito braços prendeu-os pelas pontas com as suas ventosas na pedra e, com o braço que tinha ficado livre, começou a tocar guitarra nos seus sete braços. Depois pôs-se a cantar.
Então a menina saiu da água, subiu para uma rocha e principiou a dançar. E a água junto dos seus pés ia e vinha e bailava também.
Escondido, atrás do rochedo, o rapaz, imóvel e, calado, olhava.
Quando a cantiga e a dança acabaram, o polvo pegou na menina e com os seus oito braços muito escuros pôs-se a embalá-la.
- Vem aí a maré alta, são horas de nos irmos embora - disse o caranguejo.
- Vamos - disse o polvo.
Chamaram o peixe e puseram-se os quatro a caminho. O peixe ia à frente a nadar com a menina ao lado, depois vinha o polvo e no fim o caranguejo, sempre com um ar muito desconfiado e furioso.
Foram indo por entre as areias e as rochas, até que chegaram a uma gruta para onde entraram os quatro. O rapaz quis ir atrás deles, mas a entrada da gruta era muito pequena e ele não cabia. E como a maré estava a subir, teve que se ir embora, pois se ali ficasse morria afogado.
Foi para casa muito espantado com o que tinha visto e durante esse dia não pensou noutra coisa. Na manhã seguinte mal acordou foi a correr para a praia. Foi pelo caminho da véspera, tornou a esconder-se atrás das duas pedras, espreitou e ouviu as mesmas gargalhadas da véspera. A menina, o caranguejo, o polvo e o peixe estavam a fazer uma roda dentro de água. Estavam divertidíssimos.
O rapaz, louco de curiosidade, não conseguiu ficar quieto mais tempo. Deu um salto e agarrou a menina.
Ai, ai, ai! Que desgraça! Gritava ela.
O polvo, o caranguejo e o peixe tinham desaparecido, aterrorizados, num abrir e fechar de olhos.
Ó polvo, ó caranguejo, ó peixe, acudam-me, salvem-me – gritava a Menina do mar.
Então o polvo, o caranguejo e o peixe, apesar de estarem cheios de medo, saíram detrás das algas onde se tinham escondido, e começaram a tentar salvar a Menina. Faziam o que podiam: o polvo trepava pelas pernas do rapaz, o caranguejo com as suas tenazes belisca-lhe os pés, o peixe mordia-lhe nas canelas. Mas o rapaz era maior e tinha mais força, deu-lhes alguns pontapés e fugiu para longe com a Menina do mar que continuava a chamar:
- Ó polvo, ó caranguejo, ó peixe! - Não grites, não chores, não te assustes – dizia o rapaz. Eu não te faço mal nenhum.
-Eu sei que me vais fazer mal.
-Que mal é que eu hei-de fazer a uma menina tão pequenina e tão bonita?
- Vais-me fritar - disse a Menina do mar. E pôs-se outra vez a chorar e a gritar: - Ó polvo, ó caranguejo, ó peixe!
- Eu fritar-te! Para quê? Que ideia tão esquisita! - disse o rapaz espantadíssimo.
Os peixes dizem que os homens fritam tudo quanto apanham.
O rapaz pôs-se a rir e disse:
- Isso são os pescadores. Os pescadores é que apanham os peixes para os fritar. Mas eu não sou pescador e tu não és um peixe. Não te quero fritar nem te quero fazer mal nenhum. Só te quero ver bem, porque nunca na minha vida vi uma menina tão pequena e tão bonita. E quero que me contes quem tu és, como é que vives, o que é que fazes aqui no mar e como é que te chamas.
Então ela parou de gritar, limpou as lágrimas, penteou e alisou os cabelos com os dedos das mãos a fazerem de pente, e disse:
- Vamos sentar-nos os dois naquele rochedo e eu conto-te tudo.
- Prometes que não foges?
-Prometo.
Sentaram-se os dois, um em frente do outro e a menina contou:
- Eu sou uma menina do mar. Chamo-me Menina do Mar e não tenho outro nome. Não sei onde nasci. Um dia uma gaivota trouxe-me no bico para esta praia. Pôs-me numa rocha na maré vazia e o polvo, o caranguejo e o peixe tomaram conta de mim. Vivemos os quatro numa gruta muito bonita. O polvo arruma a casa, alisa a areia, vai buscar a comida. É de nós todos o que trabalha mais, porque tem muitos braços. O caranguejo é o cozinheiro. Faz caldo verde com limos, sorvetes de espuma, e salada de algas, sopa de tartaruga, caviar e muitas outras receitas. É um grande cozinheiro. Quando a comida está pronta o polvo põe a mesa. A toalha é uma alga branca e os pratos são conchas. Depois, à noite, o polvo faz a minha cama com algas muito verdes e muito macias. Mas o costureiro dos meus vestidos é o caranguejo. E é também o meu ourives: ele é que faz os meus colares de búzios, de corais e de pérolas. O peixe não faz nada porque não tem mãos, nem braços com ventosas como o polvo, nem braços com tenazes como o caranguejo. Só tem barbatanas e as barbatanas servem só para nadar. Mas é o meu melhor amigo. Como não tem braços nunca me põe de castigo. É com ele que eu brinco. Quando a maré está vazia brincamos nas rochas, quando está maré-alta damos passeios no fundo do mar. Tu nunca foste ao fundo do mar e não sabes como lá tudo é bonito. Há florestas de algas, jardins de anémonas, prados de conchas. Há cavalos-marinhos suspensos água com um ar espantado, como pontos de interrogação. Há flores que parecem animais e animais que parecem flores. Há grutas misteriosas, azuis-escuras, roxas, verdes e há planícies sem fim de areia branca, lisa. Tu és da terra e se fosses ao fundo do mar morrias afogado. Mas eu sou uma menina do mar. Posso respirar dentro da água como os peixes e posso respirar fora da água como os homens. E posso passear pelo mar todo e fazer tudo quanto eu quero e ninguém me faz mal porque eu sou a bailarina da Grande Raia. E a Grande Raia é a dona destes mares. É enorme, tão grande que é capaz de engolir um barco com dez homens dentro. Tem cara de má e come homens e peixes e está sempre com fome. A mim não me come porque diz que eu sou pequena de mais e não sirvo para comer, só sirvo para dançar. E a Raia gosta muito de me ver dançar. Quando ela dá uma festa convida os tubarões e as baleias e sentam-se todos no fundo do mar e eu danço em frente deles até de madrugada. E quando a Raia está triste ou mal disposta eu também tenho que dançar para a distrair. Por isso sou a bailarina do mar e faço tudo quanto eu quero e todos gostam de mim. Mas eu não gosto nada da Raia e tenho medo dela. Ela detesta os homens e também não gosta dos peixes. Até as baleias têm medo dela. Mas eu posso andar à vontade no mar e ninguém me come e ninguém me faz mal porque eu sou a bailarina da Raia. E agora que já contei a minha história leva-me outra vez para o pé dos meus amigos que devem estar aflitíssimos.
O rapaz pegou na Menina do Mar com muito cuidado na palma da mão e levou-a outra vez para o sítio de onde a tinha trazido. O polvo, o caranguejo e o peixe lá estavam os três a chorar abraçados.
- Estou aqui – gritou a Menina do Mar.
O polvo, o caranguejo e o peixe, mal a viram, pararam de chorar e atiraram-se os três como cães aos pés do rapaz e começaram outra vez a mordê-lo e a picá-lo. O polvo com os seus oito braços chicoteava-lhe as pernas.
- Estejam quietos, parem, não lhe façam mal, ele é meu amigo e não me vai fritar – gritou-lhes a Menina do Mar. O polvo, o caranguejo e o peixe interromperam a pancadaria, espantadíssimos com estas palavras. O rapaz baixou-se e pôs a menina na água ao pé dos seus três amigos, que davam saltos de alegria e muitas gargalhadas. Pediu à Menina do Mar, ao polvo, ao caranguejo e ao peixe para voltarem no dia seguinte à mesma hora àquele mesmo sítio.
- Tenho tanta curiosidade da Terra – disse a Menina, - amanhã, quando vieres, traz-me uma coisa da terra.
E assim ficou combinado.
No dia seguinte, logo de manhã. O rapaz foi ao seu jardim e colheu uma rosa encarnada muito perfumada. Foi para a praia e procurou o lugar da véspera.
-Bom-dia, bom-dia, bom-dia – disseram a Menina, o polvo, o caranguejo e o peixe.
-Bom-dia – disse o rapaz. E ajoelhou-se na água, em frente da Menina do Mar.
- Trago-te aqui uma flor da terra – disse; chama-se uma rosa.
E linda, é linda – disse a Menina do Mar, dando palmas de alegria e correndo e saltando em roda da rosa.
- Respira o seu cheiro para veres como é perfumada.
A Menina pôs a sua cabeça dentro do cálice da rosa e respirou longamente.
Depois levantou a cabeça e disse suspirando:
- É um perfume maravilhoso. No mar não há nenhum perfume assim. Mas estou tonta e um bocadinho triste. As coisas da terra são esquisitas. São diferentes das coisas do mar. No mar há monstros e perigos, mas as coisas bonitas são alegres. Na terra há tristeza dentro das coisas bonitas.
- Isso é por causa da saudade – disse o rapaz.
- Mas o que é a saudade? - perguntou a Menina do Mar.
- A saudade é a tristeza que fica em nós quando as coisas de que gostamos se vão embora.
- Ai! - suspirou a Menina do Mar olhando para a Terra. Por que é que me mostraste a rosa? Agora estou com vontade de chorar.
O rapaz atirou fora a rosa e disse:
- Esquece-te da rosa e vamos brincar.
E foram os cinco, o rapaz, a Menina., o polvo, o caranguejo e o peixe pelos carreirinhos de água, rindo e brincando durante a manhã toda.
Até que a maré começou a subir e o rapaz teve que se ir embora.
No dia seguinte, de manhã, tornaram a encontrar-se todos no sítio do costume.
- Bom-dia – disse a Menina. - O que é que me trouxeste hoje?
O rapaz pegou na Menina do Mar, sentou-a numa rocha e ajoelhou-se a seu lado.
- Trouxe-te isto – disse. - E uma caixa de fósforos.
- Não é muito bonito – disse a Menina.
- Não; mas tem lá dentro uma coisa maravilhosa, linda e alegre que se chama o fogo. Vais ver.
E o rapaz abriu a caixa e acendeu um fósforo.
A Menina deu palmas de alegria e pediu para tocar no fogo. - Isso – disse o rapaz – é impossível. O fogo é alegre mas queima.
- É um sol pequenino – disse a Menina do Mar.
- Sim – disse o rapaz – mas não se lhe pode tocar.
E o rapaz soprou o fósforo e o fogo apagou-se.
- Tu és bruxo – disse a Menina – sopras e as coisas desaparecem.
- Não sou bruxo. O fogo é assim. Enquanto é pequeno qualquer sopro o apaga. Mas depois de crescido pode devorar florestas e cidades.
- Então o fogo e pior do que a Raia? - perguntou - a Menina.
- É conforme. Enquanto o fogo é pequeno e tem juízo é o maior amigo do homem: aquece-o no Inverno, cozinha-lhe a comida, alumia-o durante. A noite. Mas quando o fogo cresce de mais, zanga-se, enlouquece e fica mais ávido, mais cruel e mais perigoso do que todos os animais ferozes.
- As coisas da terra são esquisitas e diferentes - disse a Menina do Mar. Conta-me mais coisas da terra.
Então sentaram-se os dois dentro de água e o rapaz contou-lhe como era a sua casa e o seu jardim e como eram as cidades e os campos, as florestas e as estradas.
- Ah! Como eu gostava de ver isso tudo – disse a Menina cheia de curiosidade.
- Vem comigo – disse o rapaz – eu levo-te à terra e mostro-te coisas lindas.
- Não posso porque sou uma Menina do Mar. O mar é a minha terra. Tu se vieres para o mar afogas-te. E eu se for para a terra seco. Não posso estar muito tempo fora de água. Fora de água fico como as algas na maré vaza, que ficam todas enrugados e secas. Se eu saísse do mar, ao fim de algumas horas ficava igual a um farrapo de roupa velha ou a um papel de jornal, destes que às vezes há nas praias e que têm um ar tão triste e infeliz de coisa que já não serve e que foi deitada fora e que já ninguém quer.
- Que pena que eu tenho de não te poder mostrar a terra! – disse o rapaz.
- E eu que pena tenho de não te poder levar comigo ao fundo do mar para te mostrar as florestas de algas, as grutas de corais e os jardins de anémonas!
E nessa manhã o rapaz e a Menina, enquanto nadavam na água, iam contando um ao outro as histórias do mar e as histórias da terra.
Até que a maré subiu e despediram-se.
No dia seguinte o rapaz chegou à praia, sentou-se ao lado da Menina do Mar e disse:
- Hoje trago-te uma coisa da terra que é bonita e tem lá dentro alegria. Chama-se vinho. Quem bebe fica cheio de alegria.
Enquanto dizia isto o rapaz pousou no ar um copo cheio de vinho. Era um daqueles copos muito pequenos que servem para beber licores. A Menina do Mar segurou o copo com as duas mãos e olhou o vinho cheia de curiosidade, respirando o seu perfume.
- É muito encarnado e muito perfumado – disse ela. - Conta-me o que é o vinho.
- Na terra – respondeu o rapaz – há uma planta que se chama videira. No Inverno parece morta e seca. Mas na Primavera enche-se de folhas e no Verão enche-se de frutos que se chamam uvas e que crescem em cachos. E no Outono os homens colhem os cachos de uvas e põem-nos em grandes tanques de pedra onde os pisam até que o seu sumo escorra. E a esse sumo dos frutos da videira que chamamos o vinho. Esta é a história do vinho, mas o seu sabor não o sei contar. Bebe se queres saber como é.
E a Menina bebeu o vinho, riu-se e disse:
- É bom e é alegre. Agora já sei o que é a terra. Agora já sei o que é o sabor da Primavera, do Verão e do Outono. Já sei o que é o sabor dos frutos. Já sei o que é a frescura das árvores. Já sei como é o calor duma montanha ao sol. Leva-me a ver a terra. Eu quero ir ver a terra. Há tantas coisas que eu não sei. O mar é uma prisão transparente e gelada. No mar não há Primavera nem Outono. No mar o tempo não morre. As anémonas estão sempre em flor e a espuma é sempre branca. Leva-me a ver a terra.
- Tenho uma ideia – disse o rapaz. - Amanhã trago um balde e encho-o com água do mar e algas. E tu pões-te dentro do balde para não secares e eu levo-te comigo a ver a terra.
- Está bem – disse a Menina. - Amanhã vou contigo dentro do balde de água. E vou ver a tua casa e vou ver o teu jardim e vou ver passar os comboios: e vou ver a noite numa cidade cheia de luzes, de gente e de carros. E vou ver os animais da terra, os cães, os cavalos, os gatos: e vou ver as montanhas, as florestas e todas as coisas que me contaste.
E assim o rapaz e a Menina do Mar passaram o resto da manhã a fazer planos para a aventura do dia seguinte. Até que a maré subiu e o rapaz foi-se embora.
No outro dia o rapaz veio para as rochas com o balde. Vinha muito alegre, entusiasmado com o seu projecto, cantando e dando saltos. Mas quando chegou à poça de água encontrou a Menina do Mar com um ar muito desesperado e o polvo, o caranguejo e o peixe todos três com cara de caso.
- Bom-dia – disse o rapaz. Trago aqui o balde. Vamos embora depressa.
- Eu não posso ir – disse a Menina do Mar. E desatou a chorar como uma fonte.
- Mas porquê? - perguntou o rapaz.
- Por causa dos búzios. Os búzios têm muito bom ouvido, ouvem tudo, são os ouvidos do mar. E ouviram as nossas conversas e foram contá-las à Raia que ficou furiosa e agora eu já não posso ir contigo.
- Mas a Raia não está aqui. Mete-te dentro do balde e vamos embora depressa.
- É impossível – disse a Menina do Mar. A Raia ordenou aos polvos que não me deixassem passar. As rochas estão cheias de polvos escondidos que nós não vemos, mas que nos vêem e espiam cada um dos nossos gestos. Tenho que te dizer adeus para sempre. Amanhã já não volto aqui porque a Raia, para me castigar de eu ter querido fugir, decidiu que esta noite ao nascer da Lua eu serei levada pelos polvos, para uma praia distante, que eu não sei como se chama, nem onde fica. E nunca mais nos poderemos encontrar.
- Vamos experimentar fugir – disse o rapaz. Eu com as minhas duas pernas corro mais do que os polvos com os seus oito braços, que nem são braços nem são pernas.
E, tendo dito isto, pôs a Menina do Mar dentro do balde e pôs-se a correr. Mas, no mesmo instante, as rochas cobriram-se de polvos. Para qualquer lado que ele olhasse só via polvos. Procurou uma aberta por onde passar mas não havia nenhuma. Em sua roda os polvos tinham feito um círculo fechado. E ele estava no meio do círculo e não podia fugir. Então tentou saltar por cima dos polvos, mas logo dezenas de tentáculos lhe ataram as pernas.
- Larga-me, larga-me – dizia a Menina do Mar. Larga-me senão matam-te.
- Não, não te largo – respondeu o rapaz.
Mas já os polvos lhe envolviam a cintura e o peito, lhe prendiam os ombros, lhe atavam os pulsos e ele caiu nas rochas sem poder fazer nenhum gesto. Mas a sua mão ainda não tinha largado o balde. Até que um polvo se enrolou à roda do seu pescoço e o foi apertando lentamente. Então o rapaz viu o céu ficar preto, deixou de ouvir o barulho das ondas e esqueceu-se de tudo. Estava desmaiado. Acordou com a água a bater-lhe na cara. A maré tinha subido e as ondas já quase cobriam a rocha onde ele estava caído. Levantou-se e todo o seu corpo ainda lhe doía, coberto de marcas deixadas pelas ventosas dos polvos. Foi para casa devagar.
Passaram dias e dias. O rapaz voltou muitas vezes às rochas mas nunca mais viu a Menina nem os seus três amigos. Era como se tudo tivesse sido um sonho.
Até que chegou o Inverno. O tempo estava frio, o mar cinzento e chovia quase todos os dias. E numa manhã de nevoeiro o rapaz sentou-se na praia a pensar na Menina do Mar. E enquanto assim estava viu uma gaivota que vinha do mar alto com uma coisa no bico. Era uma coisa brilhante que reflectia luz e o rapaz pensou que devia ser um peixe. Mas a gaivota chegou junto dele, deu urna volta no ar e deixou cair a coisa na areia.
O rapaz apanhou-a e viu que era um frasco cheio duma água muito clara e luminoso.
- Bom-dia, bom-dia – disse a gaivota.
- Bom-dia, bom-dia – respondeu o rapaz.
Donde é que vens e porque é que me dás este frasco?
- Venho da parte da Menina do Mar – disse a gaivota. Ela manda-te dizer que já sabe o que é a saudade. E pediu-me para te perguntar se queres ir ter com ela ao fundo do mar.
- Quero, quero – disse o rapaz. Mas como é que eu hei-de ir ao fundo do mar sem me afogar?
- O frasco que te dei tem dentro suco de anémonas e suco de plantas mágicas. Se beberes agora este filtro passarás a ser como a Menina do Mar. Poderás viver dentro da água como os peixes e fora da água como os homens.
- Vou beber já – disse o rapaz.
E bebeu o filtro.
Então viu tudo à sua roda tornar-se mais vivo e mais brilhante. Sentiu-se alegre, feliz, contente como um peixe. Era como se alguma coisa nos seus movimentos tivesse ficado mais livre, mais forte, mais fresca e mais leve.
- Ali no mar – disse a gaivota – está um golfinho à tua espera para te ensinar o caminho.
O rapaz olhou e viu um grande golfinho preto e brilhante dando saltos atrás da arrebentação das ondas. Então disse:
- Adeus, adeus, gaivota. Obrigado, obrigado.
E correu para as ondas e nadou até ao golfinho.
- Agarra-te à minha cauda - disse o golfinho.
E foram os dois pelo mar fora.
Nadaram muitos dias e muitas noites através de calmarias e tempestades.
Atravessaram o mar dos Sargaços e viram os peixes voadores. E viram as grandes baleias que atiram repuxos de água para o céu e viram os grandes vapores que deixam atrás de si colunas de fumo suspensas no ar. E viram os icebergues majestosos e brancos na solidão do oceano. E nadaram ao lado dos veleiros que corriam velozes esticados no vento. E os marinheiros gritavam de espanto quando viam um rapaz agarrado à cauda dum golfinho. Mas eles mergulhavam e desciam ao fundo do mar para não serem pescados.
Aí estavam os antigos navios naufragados com os seus cofres carregados de oiro e os seus mastros quebrados cobertos de anémonas e conchas.
Depois de nadarem sessenta dias e sessenta noites chegaram a uma ilha rodeada de corais. O golfinho deu a volta à ilha e por fim parou em frente duma gruta e disse:
- É aqui: entra na gruta e encontrarás a Menina do Mar.
- Adeus, adeus, golfinho. Obrigado, obrigado.
A gruta era toda de coral e o seu chão era de areia branca e fina. Tinha em frente um jardim de anémonas azuis.
O rapaz entrou na gruta e espreitou. A Menina, o polvo, o caranguejo e o peixe estavam a brincar com conchinhas. Estavam quietos, tristes e calados. De vez em quando a Menina suspirava.
- Estou aqui! Cheguei! sou eu! - gritou o rapaz.
Todos se voltaram para ele. Houve um momento de grande confusão. Todos se abraçaram, todos riam, todos gritavam. A Menina do Mar dançava, batia palmas e ria com gargalhadas claras como a água. O polvo fazia o pino. O caranguejo dava cambalhotas e o peixe dava saltos mortais. Depois de todas estas habilidades ficaram um pouco mais calmos.
Então a Menina do Mar sentou-se no ombro do rapaz e disse:
- Estou tão feliz, tão feliz, tão feliz! Pensei que nunca mais te ia ver. Sem ti o mar, apesar de todas as suas anémonas, parecia triste e vazio. E eu passava os dias inteiros a suspirar. E não sabia o que havia de fazer. Até que um dia o Rei-do-mar deu uma grande festa. Convidou muitas baleias, muitos tubarões e muitos peixes importantes. E mandou-me ir ao palácio para eu dançar na festa. No fim do banquete chegou a altura da minha dança e eu entrei na gruta onde o Rei-do-mar estava com os seus convidados, sentado no seu trono de nácar, rodeado de cavalos-marinhos. Então os búzios começaram a cantar uma cantiga antiquíssima que foi inventada no princípio do Mundo. Mas eu estava muito triste e por isso dancei muito mal.
- Porque é que estás a dançar tão mal? - perguntou o Rei do Mar.
- Porque estou cheia de saudades – respondi eu.
- Saudades? - disse o Rei do Mar. Que história é essa?
E perguntou ao polvo, ao caranguejo e ao peixe o que tinha acontecido. Eles contaram-lhe tudo. Então o Rei-do-mar teve pena da minha tristeza e teve pena de ver uma bailarina que já não sabia dançar. E disse:
- Amanhã de manhã vem ao meu palácio.
No dia seguinte de manhã eu voltei ao palácio. E o Rei-do-mar sentou-me no seu ombro e subiu comigo à tuna das águas. Chamou uma gaivota, deu-lhe o frasco com o filtro das anémonas e mandou-a ir à tua procura. E foi assim que eu consegui que tu voltasses.
- Agora nunca mais nos separamos – disse o rapaz.
- Agora vais ser forte como um polvo.
- Agora vais ser sábio como um caranguejo – disse o caranguejo.
- Agora vais ser feliz como um peixe – disse o peixe.
- Agora a tua terra é o Mar – disse a Menina do Mar.
E foram os cinco através de florestas, areais e grutas.
No dia seguinte houve outra festa no Palácio do Rei. A Menina do Mar dançou toda a noite e as baleias, os tubarões as tartarugas e todos os peixes diziam:
- Nunca vimos dançar tão bem.
E o Rei-do-mar estava sentado no seu trono de nácar, rodeado de cavalos-marinhos, e o seu manto de púrpura nas águas.
O rapazito adorava a praia era muito importante para ele. Todos os dias tinha que lá ir, adorava os rochedos, adorava o cheiro a mar, as algas verdes.
Rapazito: era um rapaz curioso, era um rapaz que adorava a praia, gostava de passear, nadar, para ele não havia nada mais bonita a não ser a praia.
Polvo: gostava de cantar, tocava guitarra. Era um dos amigos da menina do mar, arruma a casa, alisa a areia, vai buscar a comida, põe a mesa, faz a cama da amiga com algas muito verdes e muito macias.
Caranguejo: andava sempre com cara de mau e desconfiado, era amigo da menina do mar, era o cozinheiro fazia caldo verde com limos, sorvetes de espuma, e salada de algas, sopa de tartaruga, caviar e muitas outras receitas. Era um grande cozinheiro, era o costureiro e ourives da amiga, fazia – lhe colares de búzios, de corais e de pérolas.
Peixe: era o melhor amigo da menina do mar, chama – se Pirolito, não fazia nada senão brincar e nadar com a amiga.
Menina do Mar: era uma menina pequena, media um palmo de altura, tinha cabelos verdes, olhos roxos e um vestido feito de algas encarnadas, era bonita, gostava de dançar, tinha muitos amigos.
Diálogo:
“ - Vem aí a maré-alta, são horas de nos irmos embora – disse o caranguejo.
- Vamos – disse o polvo.”
Descrição:“ Há florestas de algas, jardins de anémonas, prados de conchas. Há cavalos-marinhos suspensos água com um ar espantado, como pontos de interrogação. Há flores que parecem animais e animais que parecem flores. Há grutas misteriosas, azuis-escuras, roxas, verdes e há planícies sem fim de areia branca, lisa.”
Narração: “ O rapaz pegou na Menina do Mar com muito cuidado na palma da mão e levou-a outra vez para o sítio de onde a tinha trazido.”
Com este trabalho consegui perceber que Sophia começou a escrever poesia e prosa por incentivo dos filhos. Deve ter sido uma das escritores a receber mais prémios, fez bastantes obras. Todas elas bem constituídas e bem formadas.