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Projecto individual de leitura sobre o conto "O Sr. Nicolau", realizado no âmbito da disciplina de Português (11º ano).
Este trabalho surgiu no âmbito da disciplina de literatura, tendo como visão a autonomia e produção textual pessoal, portanto é a isso que me proponho neste projeto individual de leitura.
Vou então analisar de acordo com os parâmetros estipulados o conto que me foi atribuído pela professora.
O pai queria fazer dele um homem. Por isso, mal o pequeno acabou a 4.ª classe em Pedornelo, Guimarães com ele!
Mas não havia padre Macário capaz de endireitar semelhante criatura. Nem a puxões de orelhas e a golpes de régua se conseguia evitar que o rapaz saltasse a toda a hora pelas janelas do colégio e desaparecesse pelas serras a cabo, aos grilos. Trazia já o vício da terra; mas, com a idade, em vez de a coisa melhorar, piorava.
De palha na mão, era vê-lo à torreira do sol. Metia a sonda em cada agulheiro que encontrava, punha-se a esgravatar, a esgravatar, e o pobre do habitante do buraco não tinha outro remédio senão vir à tona.
Só quando o estômago dava horas das grandes regressava a casa com vinte ou trinta bichos daqueles. O reitor mandava-o ir ao gabinete, punha-lhe a cara num pimentão, mas de pouco valia. No dia seguinte, lá fugia ele outra vez.
Tinha o quarto transformado em viveiro. Em vez de retratos de atrizes e de cowboys, gaiolas de todos os tamanhos dependuradas nas paredes, com folhas de alface e de serradela metidas nas grades. E era num tal cenário que o prefeito o encontrava - quando o encontrava -, abstrato, alheado, fora do mundo.
- A lição?
- Estou a estudá-la...
Na aula a seguir é que a coisa se via: um estenderete!
Contudo, como inexplicavelmente na cadeira do Dr. Rodrigues só tirava vintes, e o professor gorava de grande prestígio entre os colegas, ano sim, ano não, lá passava. A nota de Zoologia podia muito. E os outros mestres, apertados, davam o 10 e desabafavam:
- Vá lá... Como sabe tanto de grilos...
- No fim do curso do liceu, Coimbra. Para médico. O pai sonhava com ele em Pedornelo a curar maleitas.
Mas quando, ao cabo de seis anos, o velho julgava que tinha ali o Paracelso dos Paracelsos, a folha corrida do rapaz registava apenas uma enigmática distinção em ciências naturais e reprovações no resto.
Deus não quis, todavia, matar o santo homem com a punhalada duma desilusão. Nas vésperas de o cábula regressar, mandou-lhe piedosamente uma broncopneumonia, que o levou desta para melhor, juntamente com as esperanças que depositara no filho.
E foi assim, herdeiro das ricas terras do pai, e com a Arca de Noé sabida de cabo a rabo, que o Sr. Nicolau voltou definitivamente a Pedornelo.
Andava então pelos trinta anos. Alto, seco, pálido, delicado, veio pôr na veiga e nos montes da terra uma nota que até ali não havia: a mancha lírica dum cidadão de guarda-sol branco a caçar bicharocos.
- O Sr. Nicolau passou bem?
- Bem, muito obrigado, tio Armindo...
E abaixava-se a agarrar uma louva-a-deus. Tirava um frasco do bolso, pegava na infeliz com mil cuidados, não lhe fosse quebrar um braço, e bojo do vidro com ela.
A princípio, todos arregalaram os olhos, num justo e desconfiado espanto. No que dera o filho do Sr. Adriano Gomes! Mas apenas lhes arrendou, por umas cascas de alho, os bens de que passara a ser dono, e o viram contente com a transação, mudaram de ideias e puseram-se a vender-lhe quantos insetos havia nas redondezas. Bastava chegar ao pé dele e mostrar-lhe uma joaninha, para que a comprasse logo por um tostão. De modo que semelhante maluqueira era uma mina, vista por qualquer lado.
Só o mestre-escola, o velho Sr. Anselmo, que já na instrução primária se vira e desejara para meter naquela cabeça tonta as contas de multiplicar, se mostrava renitente na aceitação de tão grande desgraça. E, quando acabou por dar o braço a torcer, foi desta maneira:
- Enfim, do mal o menos. Se lhe dá para colecionar burros, tínhamos a aldeia transformada numa estrebaria...
Mas o Sr. Nicolau resistia a tudo. Às ironias do antigo professor e ao egoísmo do povo. E, mal o sol apontava na serra de Alijo, lá ia ele pelos restolhos fora.
Vivia sozinho. Além da Gertrudes, que vinha de vez em quando lavar-lhe a roupa e fazer-lhe um caldo, ninguém mais lhe entrava em casa, a não ser pelo S. Miguel, na altura do pagamento das rendas. Viam-no então no escritório, entre grandes armários, onde, desde as pulgas às carochas, dormiam o sono eterno quantos seres a sua paciência e os seus vinténs conseguiram agarrar em Pedornelo e cercanias.
Tinha-os em caixas de papelão, aos centos, em fila, catalogados e suspensos num alfinete que lhes entrava nas costas e saía na barriga. Havia-os de todos os tamanhos e de todas as cores possíveis. Grandes, pequenos, pequeninos, amarelos, brancos, pretos, azuis, vermelhos, um ou dois de cada qualidade e de quantas qualidades fora capaz a imaginação divina.
Calmamente, amorosamente, à medida que o tempo andava, crescia o cemitério. E, calmamente, o coveiro, o Sr. Nicolau, ia envelhecendo entre os mortos.
O seu mundo fechara-se ali, concêntrico, sem horizontes, murado pelas estantes envidraçadas, onde o sonho se conservava em naftalina. As nações desabavam, sucediam-se guerras, a própria aldeia oscilava nos gonzos. Mas o senhor Nicolau, alheio às paixões humanas, continuava a povoar os dias de libélulas e borboletas.
A certa altura, o boateiro do Fagundes lançou a atoarda do próximo casamento do lunático.
- E com quem? - perguntou o professor, carregado de inocência.
Mas como ninguém lhe soube dizer o nome da noiva, rematou ele:
- Talvez com alguma lesma... E bem é. Fica tudo em família. A balela foi por assim dizer o derradeiro sinal que Pedornelo deu de que não se esquecera inteiramente da vida social do Sr. Nicolau. Porque, apenas o mestre disse a ironia, e todos acabaram de se rir à vontade, o desgraçado saiu da lembrança da povoação. Logo a seguir, quando passavam, ou já nem o cumprimentavam, ou lhe davam os bons-dias com o mesmo automatismo com que tiravam o chapéu, às Trindades. Nem que ele atravessasse o largo com uma ruga funda e desesperada na testa, se lembravam de o lamentar. O nome do amalucado, agora, significava o mesmo que carrapato, ralo, formiga ou coisa assim.
Era um bicho. Um inofensivo bicho, igual aos milhares quê tinha no escritório embalsamados.
Às vezes, a ruga tinha profundidade. Minava-o um desgosto tão verdadeiro como o de qualquer vizinho aflito com os estragos de uma trovoada. Mas cinquenta anos de alheamento coletivo tiravam-lhe o direito de ser compreendido por homens. Quem podia admitir que fossem motivo de desespero a tenaz quebrada dum besoiro ou qualquer sinal de traça numa bicha-cadela?! A sensibilidade de Pedornelo não reagia aos estímulos de tão subtis calamidades. Ali, a respeito de sofrimento, entender, só fome, febres e facadas.
Quis finalmente o Dr. Saul olhar aquele ser como habitante da terra e criatura de Deus. Chamado à pressa pela Gertrudes, que fora encontrar o velho encolhido como um feto no sofá do escritório, veio, auscultou, tomou o pulso, pôs o termómetro, e resolveu por fim entrar pelo corpo dentro do moribundo com uma agulha que lhe enterrou na espinha.
Mas o sr. Nicolau, agora, estava de todo integrado no destino dos seus companheiros. Delirava. Sentiu vagamente a dor na coluna, lembrou-se do que tinha feito aos milhares de irmãos, e pensou:
- Má técnica... Era éter acético primeiro, e só então... Oxalá não se esqueça ele ao menos de escrever no rótulo, corretamente, o meu nome em latim...
E daí a nada, depois da última contração, sereno e de olhos fechados, ali ficou quieto e feliz, à espera que o metessem na sua caixa.
Neste conto podemos comprovar que existem homens, que se sentem melhor circundados pelos animais: “O seu mundo fechara-se ali, concêntrico, sem horizontes, murado pelas estantes envidraçadas, onde sonho se conservava em naftalina. (…) Mas o senhor Nicolau, alheio às paixões humanas, continuava a povoar os dias de libélulas e borboletas.“
Miguel Torga mostra vários momentos da vida humana, os sofrimentos, a tristeza, a morte, a amizade, a esperança, a desilusão… E, através dos protagonistas humanos, que às vezes saem fora das convenções, dadas pelas regras humanas, faz-nos lembrar, que todos somos bichos, e sofremos as mesmas influências e temos que lutar pela nossa liberdade. Todos somos do mesmo mundo, que nos protege contra os desagrados do nosso Criador, da Natureza. O conto insere-se dentro de uma mundivisão própria do rural português, um meio geocultural e um determinado modo de ver, entender, classificar e atuar no mundo. Este conto não é uma fábula, nem reclama miticismo. Faz parte de uma elaborada tradição de relacionamento com a natureza e os animais por parte dos seres humanos que habitam lugares como Trás-Os-Montes, a partir da qual Torga ficcionaliza. As leituras mitificantes, provenientes de receções hetero-espaciais, hetero-temporais e, já, hetero-culturais, partem essa ponte recetiva. O que podia ser interpretado como o conjunto mais realista dos contos de Torga, na minha opinião o conto “Sr. Nicolau”, apresenta também ele elementos recetivos inclinados a distorcer a geocultura que os apoia. Isto revela algumas coisas sobre a nossa atual sociedade, que as suas leituras estão geralmente ajustadas a um mundo urbano, escolar, presidido pelas novas tecnologias, por vezes intelectualizado e sem a vivência do rural, sem o contato com a natureza, nos dias de hoje as crianças e os jovens cada vez se isolam mais do mundo exterior. E tudo aquilo que geralmente envolve dedicação, e cada vez mais aquilo que se encontra a desaparecer.
Na minha opinião, este livro sensibiliza bastante o leitor, unindo uma realidade nos dias que hoje correm, com a sua causa, o que levou a essa mesma, de uma maneira não tão direta, mas eficaz, de modo a emocionar quem o lê, a ideia principal deste livro centraliza-se numa oposição entre a vida e a cultura de uma sociedade, através da apresentação de animais com o sentir humano e vice-versa; uma irmandade entre homens e os animais. São Bichos animais e Bichos homens que se entrelaçam nas páginas deste conto. Bichos personagens, mas sentindo e agindo como se de humanos se tratassem, amizade, amor, sucedem-se pelo conto, sendo tratados como uma lição essencial de vida. O tema aqui tratado é o amor pela natureza e como um só homem pode fazer toda a diferença em mostrar todo o maior que sente pelas criaturas, os insetos, que muitos detestam, também o facto de nunca se desistir daquilo que realmente se gosta por mais que os outros não o considerem correto gostar. O tema para mim é a amizade visto que o Sr. Nicolau considerava os bichos seus amigos, e arranjava sempre de tratar deles.
O texto é uma narrativa aberta, está escrito em prosa e tem como característica a ficção, é uma narrativa de ficção.
O narrador caracteriza-se por ser heterodiegético e omnisciente visto ter um conhecimento de todos os factos; o tempo está por ordem linear e o tempo histórico podemos defini-lo por ser de um passado não muito distante em que o mundo rural ainda prevalecia mas ao mesmo tempo um tempo de viragem na história; o espaço num primeiro plano é Guimarães, depois após ter herdado um terreno mudou-se para a aldeia, aparentemente a sua verdadeira terra; os modos de expressão utilizados neste conto são a narração, a descrição, o diálogo.
O tamanho do conto - uma narrativa curta - limita à partida a variedade e extensão da análise de todos os elementos característicos da narrativa. Compreende-se desta forma a razão de haver poucas personagens, quase sempre planas: não há espaço para as explorar convenientemente. Também, por isso, recorre-se à descrição apenas quando é indispensável à progressão da ação. No entanto, é preciso recordar que estamos a referir características gerais. Neste conto é possível encontrar diálogo que tem uma importância e onde a descrição assume o destaque.
A boca selada pode salvar a vida.
Era um pai que não se cansava de dizer aos filhos: - "Boca calada! Terem a Boca calada pode-vos salvar a vida!". Um dos filhos guardou bem o conselho e saiu pelo mundo. Uma vez ele entrou numa casa, onde viu uma mulher enterrada no chão até a cintura. Ficou com muita vontade de falar, de perguntar porque era aquele castigo. Mas quando ia abrir a boca, lembrava-se do conselho. O homem da casa, então, começou a provocar o pobre rapazinho:
- Pergunta porquê que ela está enterrada..
Acontece que esse homem matava quem perguntasse alguma coisa. O menino não dizia nada. Por fim, o homem rendeu-se. Ajoelhou-se perante a mulher, pediu-lhe perdão e desenterrou-a, dizendo que aquele rapaz tinha muita integridade.
Este conto relaciona-se com o conto do sr. Nicolau porque ambos não deixaram de acreditar. E devido à sua persistência, colheram os frutos disso mesmo.
Ao realizar este trabalho tive a oportunidade de reavivar a minha memória em relação a parâmetros que já não tinha tão presentes, tirei uma vasta informação pessoal porque aprendi a ver e apreciar as coisas de forma diferente, penso no entanto que o trabalho podia ter sido um pouco mais complicado de maneira a elevar os nossos conhecimentos mas fico contente com o conteúdo que pude retirar com este.